Lima

Lima

Saíramos de Huaraz precisamente às 22h30min do dia 10 de agosto e chegamos a Lima, capital do país, por volta das seis da manhã do dia 11. Realmente não sei o motivo da demora, pois não houve muitas paradas, mas enfim…

Durante as semanas anteriores, eu fizera outro contato do Couchsurfing para a cidade. Porém, devido a tantas experiências malfadadas, Michael já estava ostensivamente decepcionado com a comunidade e bufava descontentemente por nós não irmos direto a um albergue. Para aumentar o seu desgosto, eu não tinha certeza de que poderíamos ir imediatamente para o apartamento do “host”. A pressão pelo Couch era só minha; Michael estava cansado e preferiria ir diretamente a um local que pudéssemos escolher, sem surpresas desagradáveis. De qualquer maneira, tínhamos mesmo que seguir para algum lugar; não poderíamos ficar pelas ruas ou fazer turismo durante o dia, estando carregados com as mochilas. Sugeri então que fizéssemos isso, que fôssemos a um hotel, deixássemos as bagagens, descansássemos e visitássemos o host à noite, para ter certeza da decência das acomodações e da empatia com o anfitrião. Propus a mudança, desde que ele tirasse a “tromba” da cara e conversasse comigo. No entanto, ao chegarmos à garagem da empresa Rodriguez, em Lima, fiz uma última tentativa de comunicação por telefone público com Giancarlo, nosso anfitrião, para verificar se ele ainda estava em casa e se poderia nos aguardar. Para nossa sorte, ele só sairia às sete da manhã para o trabalho e, assim, tínhamos uma hora para irmos ao seu encontro. Mesmo com a corrida superfaturada, pegamos um táxi, a fim de evitar atrasos, já que se ele deixasse a casa para o trabalho, só voltaria à noite.

Eu ainda tinha medo de novamente nos depararmos com uma casa imunda ou um host meio estranho e, por isso, tínhamos nossa desculpa para uma escapatória cortês na ponta da língua. Pelo menos, de uma vizinhança sinistra nós certamente nos livraríamos, pois o endereço do apartamento indicava o bairro Miraflores, um dos melhores de Lima. Assim, Michael ficara mais calmo, pois era para essa região, de qualquer modo, que ele pretendia seguir se nós fôssemos buscar algum albergue. Então, se não desse certo no Couch, já estaríamos na área desejada para nos dirigirmos a um hostel. Uma onda de alívio, porém, me invadiu no momento que conhecemos o amabilíssimo Giancarlo e sua simpática casinha. Depois de nos receber super bem, Gian desculpou-se e saiu para a labuta diária. Nós nos vimos, então, a sós no apartamento; tínhamos sido colocados no quarto do anfitrião, que se mudaria temporariamente para o outro aposento, quarto do primo que dividia o apê com ele, mas que viajara para o Brasil, coincidentemente, durante aquela semana. Eu não poderia ter pedido por melhor Couch: um anfitrião legal, um quarto aconchegante, lençóis limpos, edredom de pena de ganso, TV a cabo, uma cozinha equipada e um banheiro com água quente tão decente quanto poderia ser num apartamento de dois homens solteiros. Com três meses de viagem e uma série de estadas em albergues meia-boca, nós desfrutávamos momentaneamente de uma casa de verdade e da paz de um dia de folga. Olhei pro Michael e sorri aliviada. Ele também parecia consolado, feliz e livre do incômodo da véspera. Finalmente, um Couch perfeito!

Nós já tínhamos combinado de não fazer nada naquele dia; então, tomei um banho demorado e relaxante, fiz sobrancelha, depilação, passei hidratante no cabelo e tudo mais que uma sossegada manhã em silêncio me permitisse. Estava frio e eu dormi gostosamente entre os cobertores, sentindo cheiro de amaciante e escutando os filmes que Michael assistia na TV a cabo. Ah! Pequenos luxos.

À tarde, lá pelas quatro horas, fomos a um pequeno mercado no bairro e compramos itens para um almoço caseiro, além de outras coisas para lanches e cafés da manhã. Gian havia deixado um atencioso recadinho com seu endereço de trabalho, senha da internet WIFI, seus números de telefone e a localização do mercado mais próximo, até com um mapinha desenhado… Que consideração!

Como há tempos nós não preparávamos nada em uma cozinha decente, assim que voltamos das compras, esbanjei todo meu pífio conhecimento culinário em um macarrão com molho branco, peito de peru e brócolis ao alho e óleo. Uma delícia!

No caminho do supermercado, Miraflores nos surpreendia. Bairro nobre e muito bonito, de bons condomínios, mansões ajardinadas, ruas arborizadas e também várias guaritas. O prédio do Giancarlo era mais simples, contrastando um pouco com as belas casas da região, mas organizado e com bons apartamentos. Nós caminhávamos pelas ruas largas e limpas, sentindo uma sensação repousante de familiaridade. Eu agradeci não ter ficado em Huaraz para nosso programado dia de folga, depois de tantos tours e passeios naquela região. Estávamos cansados e tínhamos mesmo decidido nos presentear um dia inteiro sem “compromissos”. Em princípio, ficaríamos em Huaraz, mas decidimos ir para Lima e descansar no primeiro dia na cidade; ainda bem, pois em Huaraz, teríamos feito check-out ao meio-dia do dia 11 e ficado a tarde toda na recepção do hotel, na Internet, para esperar pelo ônibus que partiria somente à noite, ou pagaríamos outra diária apenas para passar a tarde dentro do quarto, sem TV, banheiro ou cozinha. Não teria sido um descanso confortável. Então, me sentia muito bem pela escolha acertada e pelo divino Couch de Lima.

À noite, Giancarlo voltou do trabalho na Lan, uma empresa aérea, gentilmente elogiou minha comida e saiu conosco para dar uma volta. Por trabalhar com turismo e ter estudado hotelaria na faculdade, nosso anfitrião tinha conhecimento histórico do seu país e, como um guia turístico, nos brindava com informações interessantes sobre a cultura e história peruanas. Era tudo que eu queria!

A cinco quadras da casa dele, cruzando a Avenida del Ejército, é possível chegar ao Malecón de Miraflores – o calçadão. Lima já tinha começado a me surpreender ainda do ônibus, com suas ruas e avenidas largas, edifícios modernos e ar cosmopolita, e o calçadão de Miraflores é seguramente o mais bonito que eu já conheci. O que diferencia Lima de qualquer outra capital a beira-mar e faz do calçadão um ambiente único é justamente sua topografia única; apesar de ter praia, Lima está a 154 metros acima do nível do mar. Como? A razão é perfeitamente visível do bairro de Miraflores: do calçadão, observamos o oceano e a ampla avenida que o margeia, a Costa Verde; logo em seguida, um penhasco de 154 metros eleva-se abruptamente dando início à planície na qual a cidade se assenta. Dessa forma, do malecón, nós observamos o mar lá em baixo, o que deixa o horizonte ainda mais infinito.

avenida Costa Verde (reprodução de foto da Internet)

avenida Costa Verde (reprodução de foto da Internet)

 

Miraflores Malecón

Miraflores Malecón

 

vista de Miraflores

vista de Miraflores

 

vista de Miraflores

vista de Miraflores

 

vista de Miraflores

vista de Miraflores

A vista é linda e o calçadão, cuidadosamente planejado para que se aproveite ao máximo essa paisagem, é simplesmente um encanto. São parques, praças, jardins, playgrounds, quadras de esportes, ciclovias e pistas de Cooper que se estendem ao longo de quilômetros, entre as ruas e o abismo. Sorte dos moradores dos edifícios que contornam o malecón, presenteados com vista para o mar e uma área de lazer de tirar o chapéu! Eu não posso afirmar com certeza sobre valores imobiliários da capital peruana, mas ao perguntar a outro amigo limenho qual era a média de preços dos belíssimos apartamentos de frente para o mar em Miraflores, ele soltou a frase: “Ah, são caríssimos, na faixa de 250, 300 mil dólares!”. Meu deus! Honestamente, eu partiria de dois milhões pra cima. Deu vontade que comprar um apê em Lima!

calçadão em Miraflores

calçadão em Miraflores

 

calçadão em Miraflores

calçadão em Miraflores

 

calçadão

calçadão

 

calçadão

calçadão

 

farol do calçadão

farol do calçadão

Durante nosso passeio noturno, observávamos as luzes das salas lindamente decoradas e das varandas que margeavam o calçadão, enquanto pessoas corriam e se exercitavam nas pistas; canteiros planejados e luzes reproduziam as linhas de Nasca sobre os gramados dos parques e a cada olhar nos deslumbrávamos mais.

linhas de Nazca

linhas de Nazca

 

linhas de Nazca nos canteiros de Miraflores

linhas de Nazca nos canteiros de Miraflores

 

linhas de Nazca

linhas de Nazca

Uns três quilômetros depois, alcançamos o Shopping Center Larcomar, inaugurado em 1998 e construído por um grupo de investidores coreanos. O conjunto de lojas chiques, restaurantes sofisticados, bares, cinemas e boates aproveita com maestria a geografia do terreno. O Larcomar foi planejado justamente para que aqueles que o visitem ainda possam desfrutar da vista privilegiada do oceano pacífico e, para tanto, é um shopping a céu aberto, que se debruça sobre o mar; as escadas rolantes, corredores e espaços da parte central estão ao ar livre e obviamente somente as lojas encontram-se protegidas, edificadas nos mezaninos que contornam a área do centro. De fato, só a arquitetura do lugar e sua magnífica vista panorâmica valem a visita, mesmo àqueles que, assim como eu, não liguem muito para shoppings. Ele é meio caro para almoçar ou fazer compras, mas é um ótimo passeio.

shopping Larcomar

shopping Larcomar

 

Larcomar

Larcomar

 

Larcomar

Larcomar

Na frente do Larcomar, há hotéis caríssimos. Entre eles, um Marriott onde o ex-presidente Bush já se hospedara. Ficamos um pouco no shopping, saímos e andamos na avenida da frente perpendicularmente, a José Larco. Nela, assim como na famosa travessa, a Avenida Alfredo Benavides, cassinos com fachadas brilhantes, bancos, casas de câmbio, lanchonetes e lojas muito bonitas deixam a capital peruana excitantemente urbana e com uma atmosfera internacional.

cassinos

cassinos

Caminhamos até um parque com uma feirinha de artesanato e um bulevar lotado de bares da moda. Muita gente e muita música disputavam nossa atenção e escolhemos ficar um pouco justamente em um bar brasileiro, chamado Alô Brasil. Dois dançarinos rebolavam sincrônica e estonteantemente ao som de axé enquanto os rapazes tomavam Cusqueña, uma das cervejas mais famosas do Peru. Retornamos de táxi, por volta da meia-noite, e demos o dia por encerrado.

Em 12 de agosto, Michael e eu levantamos tarde e Gian já tinha saído para trabalhar. Delicadamente, ele nos deixara café pronto e um bilhete indicando que Michael o tomasse. Saímos pela hora do almoço e refizemos o caminho do dia anterior, para tirar fotos com luz e conhecer mais o bairro de Miraflores. Surpreendentemente, o anfitrião nos dera as chaves do apartamento, para que pudéssemos ir e vir com mais liberdade. Com franqueza, eu mesma não faria isso… Admirei a confiança e fizemos de tudo para continuar a merecê-la.

A tarde estava cinza e descobrimos que essa condição era comum para a época do ano. A combinação de condições atmosféricas específicas produz, em Lima, um clima bastante peculiar. No inverno, que vai de junho a setembro, a temperatura média fica em torno de 15°C e o período registra a presença persistente de uma neblina espessa, que deixa o céu constantemente acinzentado. Apesar disso, raramente chove; é estranho ver as nuvens baixas e o firmamento prenunciando uma chuva que nunca vem. O céu geralmente se abre e exibe seu azul intenso durante o verão e a primavera, cuja média de temperatura gira em suaves 20°C. Por estar localizada nos trópicos e pela sua latitude, Lima deveria experimentar verões bastante calorosos, mas em poucas oportunidades, a cidade apontou temperaturas extremamente quentes ou ainda muito frias. Essas características devem-se à corrente de Humboldt que, durante o verão, esfria o normalmente caloroso ambiente tropical e, no inverno, produz uma nuvem baixa, que impede a passagem da luz, mas que não está carregada de chuva. Assim, seus elevados níveis de umidade e baixíssima precipitação, cerca de sete milímetros anuais, são permanentes. Então, apesar de úmida e frequentemente cinza – Lima Gris, como é chamada pelos habitantes – a capital peruana tem clima de deserto, pela falta de chuvas.

Lima Gris

Lima Gris

Nós caminhamos novamente pelo Malecón até o shopping Larcomar e mesmo com o céu fechado, pudemos ver melhor todos os detalhes que fazem o calçadão de Lima ser incrível. Na altura do Malecón Balta, há uma praça agradável dedicada ao amor, o Parque del Amor. Mosaicos de azulejos coloridos formam espaços interessantes e chamativos. Dali, podemos ver também o local de onde partem os voos de parapente diários que percorrem os céus de Miraflores, pela média de preços de 150 soles.

bairro Miraflores (reprodução de imagem da Internet)

bairro Miraflores (reprodução de imagem da Internet)

 

andando pelo calçadão

andando pelo calçadão

 

Parque do Amor

Parque do Amor

 

Parque do Amor e ponto dos parapentes

Parque do Amor e ponto dos parapentes

 

Parque do Amor

Parque do Amor

 

parapente em Miraflores

parapente em Miraflores

Bem, como as coisas não devem ser só flores ou amor no belo bairro de Lima e alguns moradores estressados prefiram ascender ao paraíso por outros meios, a ponte E-Villena-Rey, construída em 1967 logo ao lado da Praça do Amor, ganhou recentemente grades acrílicas de proteção para evitar os suicídios cometidos nela que, segundo Giancarlo, eram muitos.

ponte

ponte

Enfim, do shopping Larcomar, seguimos de novo pela Avenida José Larco até os parques. O Parque Kennedy, ou Sete de Junio, faz parte do Parque Central; são, na verdade, duas praças pequenas no coração de Miraflores que funcionam como espaços culturais, ecológicos e turísticos do bairro. Há feirinhas de artesanato, canteiros lindamente floridos, árvores frondosas, uma área para apresentações teatrais e belas construções como a Igreja Matriz e a Sede do governo do bairro de Miraflores (a Municipalidad de Miraflores). Muitos albergues também se concentram na área, já que o bairro é o preferido entre os viajantes.

municipalidad de Miraflores

municipalidad de Miraflores

 

igreja Matriz

igreja Matriz

O Parque Central é ainda conhecido como Parque dos Gatos e voluntários garantem a alimentação dos felinos que ali se acumulam; quando o rango foi servido, eu contei 16 chaninhos entre árvores e canteiros de flores que se aproximaram dos pratos cheios de ração dispostos no gramado. Durante a noite, os gatos, as crianças e os idosos que lotam as praças de dia, dão espaço aos boêmios amantes dos bares, peruanos e gringos, que movimentam a Calle de las Pizzas, a rua cheia de opções pra beber e curtir, como o bar Alô Brasil, onde estivéramos no dia anterior.

Parque Kennedy

Parque Kennedy

 

parque dos gatos

parque dos gatos

 

parque dos gatos

parque dos gatos

Esticamos mais um pouco até a Avenida Petit Thouars, cheia de mercados de artesanato indígena. Nós entramos em dois, o Indian Market e o Inka Plaza, e deu vontade de estar com muita grana! Várias outras lojas ao longo do caminho também nos seduzem às compras. Já eram umas cinco da tarde quando começamos a voltar; estávamos exaustos de tanto andar e só chegamos à noite ao apartamento. Em Miraflores, não nos sentimos inseguros em momento algum.

Indian Market

Indian Market

 

mapa Miraflores (reprodução de imagem da Internet)

mapa Miraflores (reprodução de imagem da Internet)

Mais tarde, pela Internet, falei com o Carlos, o peruano gatíssimo que havíamos conhecido lá no albergue de Santa Marta, na Colômbia. Confirmando minhas suspeitas que tinha rolado um interesse mútuo, ele ficou de nos apanhar dia seguinte depois das seis, para sairmos. Gian continuou a se mostrar um anfitrião perfeito e até nos preparou jantar, “aji de gallina”, um prato típico feito de frango com uma pimenta tradicional do Peru e acompanhado de arroz. Estava ótimo!

Nossa programação para o dia 13 de agosto era deixar a modernidade de Miraflores e explorar a Lima Antiga, o centro histórico da capital. Pegamos um miniônibus, pelo valor de um sol, do Parque Mora, uma praçinha aprazível na rua do apartamento, até a Ponte Angamos, na avenida de mesmo nome, área mais central da cidade. Em seguida, na Via Expressa, na Estacion Angamos, tomamos um ônibus metropolitano de 1,50 sol até a Estacion Central. Já a pé, iniciamos nossa longa caminhada pelo centro e centro histórico.

centro histórico Lima (reprodução de imagem da Internet)

centro histórico Lima (reprodução de imagem da Internet)

 

centro histórico (reprodução de imagem da Internet)

centro histórico (reprodução de imagem da Internet)

Descemos na Avenida Nicolás de Pierola, mas ao invés de irmos diretamente ao centro histórico da cidade, resolvemos descer uns quarteirões para visitar outros pontos turísticos de interesse. Passamos em frente ao Palacio de Justicia, símbolo do poder judicial do Peru e sede da Corte Suprema de Justiça. A obra em estilo neoclássico foi proposta durante o governo de Augusto Leguía, como parte de sua política de modernização e ocidentalização da capital peruana e foi inaugurado em 1939, pelo então presidente Óscar Benavides. O edifício projetado pelo arquiteto polonês Bruno Paprowsky é inspirado no Palácio de Justiça de Bruxelas e conta com elementos Greco-romanos, como suas numerosas colunas. É de fato uma bela edificação. Na sua escadaria de entrada, há dois leões de mármore branco que contrastam com o acinzentado do granito do restante da fachada; o motivo é que os felinos não eram parte do projeto original, mas foram levados para o palácio por serem os dois últimos “sobreviventes” de uma série de 12 estátuas que um dia adornaram o Paseo Colón, também nas redondezas. As esculturas já haviam sido resgatadas de outra cidade e, no Paseo Colón, passaram pouco a pouco a se deteriorar ou desaparecer. Assim, para que as duas não sofressem o mesmo destino, foram destinadas a proteger o Palácio da Justiça.

Palácio da Justiça (reprodução de foto da Internet)

Palácio da Justiça (reprodução de foto da Internet)

 

leões na escadaria

leões na escadaria

 

Palácio da Justiça

Palácio da Justiça

Em frente ao palácio, há o Paseo de los Héroes Navales, uma bonita praça com canteiros floridos e esculturas de bronze.

Paseo de los Héroes Navales

Paseo de los Héroes Navales

 

Paseo de los Héroes Navales

Paseo de los Héroes Navales

 

Paseo de los Héroes Navales

Paseo de los Héroes Navales

 

Paseo de los Héroes Navales

Paseo de los Héroes Navales

Continuamos até o Parque de La Exposición, onde está o MALI – Museo de Arte de Lima. Nós não entramos no museu, mas passeamos um pouco pelo parque. A área cercada tem lindos gramados, flores, casas interessantes, como um gazebo romântico, e um monumento. É um bom espaço para relaxar.

Parque la Exposición

Parque la Exposición

 

Parque la Exposición

Parque la Exposición

O Paseo Colón, avenida em frente ao parque, possui cinco quadras entre as praças Plaza Bolognesi e Plaza Grau. Nessa avenida aristocrática, anteriormente chamada de 9 de Diciembre, ergueram-se no século XIX, lindíssimos casarões em estilo republicano. Hoje, muitos estão decadentes, mas outros ainda carregam o charme de tempos áureos.

Plaza Bolognesi

Plaza Bolognesi

 

Plaza Bolognesi em 1928 (reprodução de foto da Internet)

Plaza Bolognesi em 1928 (reprodução de foto da Internet)

 

Plaza Grau

Plaza Grau

 

casarões no Paseo Colón

casarões no Paseo Colón

 

casarões

casarões

 

casarões

casarões

 

casarões

casarões

Depois de caminhar na Avenida Colón, retornamos pelo Paseo de los Héroes Navales e alcançamos, minutos depois, a Plaza San Martin, praça rodeada de edifícios brancos maravilhosos que hoje abrigam hotéis chiques, bancos e comércios. No centro da praça, uma estátua de bronze homenageia o general José de San Martín, que foi decisivo nas campanhas de independência do Peru, em 1821, além de Chile e Argentina.

Plaza San Martin

Plaza San Martin

 

Plaza San Martin (reprodução de foto da Internet)

Plaza San Martin (reprodução de foto da Internet)

 

Seguimos pela Calle (rua) Jirón De La Unión, passando pela bonita Iglesia de La Merced, igreja de uma única torre, cujo início da construção data de 1535. Com fachada em estilo barroco e colunas salomônicas, foi posteriormente restaurada no século XVIII. Nessa rua, nós almoçamos e prosseguimos com o passeio.

Iglesia de la Merced

Iglesia de la Merced

Viramos à esquerda e voltamos um pouco, na Avenida Emancipación, onde comemos um churros maravilhoso e pudemos visitar a super trabalhada Iglesia San Marcelo, elevada a categoria de paróquia em 1585. Sua rica fachada em estilo rococó já foi marfim, salmão e bege e até verde e bege, mas em 2011, ela ganhou um tom de vermelho sangue contrastando com o branco dos ornamentos. Ficou linda!

San Marcelo

San Marcelo

Sem descanso, seguimos atravessando a Avenida Jr. Huancavelica e passando por ruas meio estranhas. Os casarões diminuíram e sobrados abatidos e cortiços tomaram seu lugar. Chegamos até a andar um pouco mais rápido…

área menos nobre

área menos nobre

Logo depois, porém, as belas fachadas voltaram e finalmente chegamos à deslumbrante Plaza Mayor ou Plaza de Armas. Realmente a Praça de Armas de Lima é de cair o queixo! Sem dúvida, a mais bonita que eu já visitei. Ao seu redor, três dos edifícios mais importantes da época colonial se erigiram: a Catedral de Lima, o Palacio de los Virreves (atual Palacio de Gobierno e também conhecido como Casa de Pizarro) e a Municipalidad de Lima.

Segundo Giancarlo, não há réplicas de edifícios na Praça de Armas; tudo no centro histórico de Lima é original, da época da colônia, apesar do grande terremoto que abalou as estruturas da cidade em 1746. Houve ainda outros abalos significativos no século XX, que afetaram gravemente algumas edificações. Entretanto, boa parte do legado arquitetônico colonial não precisou de reconstrução total, mas somente de remodelação e reforma.

Lima foi fundada em 18 de janeiro de 1535, pelo conquistador espanhol Francisco Pizarro, com o nome de Cidade dos Reis. Tornou-se rapidamente a cidade mais importante entre as colônias espanholas na América, como capital do vice-reino do Peru. Durante os séculos XVI e XVII, Lima foi o centro poderoso das atividades culturais e comerciais do reino; no século XVIII, perdeu um pouco de sua hegemonia devido à criação do vice-reinado do Rio da Prata, que absorveu as riquíssimas minas de Potosí. De qualquer maneira, a metrópole seguiu mantendo seu posto de prestígio e influência até hoje, sendo atualmente a segunda maior cidade da América do Sul, com cerca de 10 milhões de habitantes em toda a sua área metropolitana.

Os grandes edifícios da Praça de Armas remetem aos séculos XVII e XVIII e estão perfeitamente conservados. O amarelo forte das fachadas, assim como suas tradicionais varandas fechadas de madeira dão um toque todo especial ao espaço. Dizem que o tom berrante dos prédios é proposital para contrastar alegremente com a cor constantemente cinza dos céus limenhos.

Plaza de Armas de Lima

Plaza de Armas de Lima

 

Plaza de Armas de Lima

Plaza de Armas de Lima

 

Plaza de Armas de Lima

Plaza de Armas de Lima

Os jardins bem cuidados e palmeiras também encantam o olhar. Sem surpresa, todo o centro histórico de Lima foi declarado Patrimônio da Humanidade pela UNESCO, em 1988. Em épocas antigas, não era o título de tombamento histórico que protegia as antigas edificações limenhas, mas uma enorme muralha ao redor de toda a Cidade Velha. Hoje, não se vê mais os muros na área central da cidade, protegendo Lima contra os piratas, mas a preocupação em manter o barroco centro histórico a salvo permanece nas ações de conservação e manutenção do governo e também da população.

antiga muralha cercando o centro histórico (reprodução de imagem da Internet)

antiga muralha cercando o centro histórico (reprodução de imagem da Internet)

 

belos jardins

belos jardins

Eu estava honestamente embasbacada com a beleza do centro histórico de Lima. Não conseguia captar com minhas fotografias todos os detalhes dos edifícios da Praça de Armas, os balcões entalhados, os arcos, os jardins…

centro histórico

centro histórico

O Palácio do Governo, reformado pelo presidente Leguía em 1926, também é lindíssimo e rico em detalhes. É possível agendar com antecedência de dois dias visitas gratuitas ao interior do prédio, nas quais os turistas percorrem cinco salões principais, veem pinturas e mobiliário dos séculos XIX e XX e ainda uma figueira plantada pelo então conquistador Pizarro.

Palácio do Governo

Palácio do Governo

A Catedral, de 1746, ocupa o mesmo lugar do edifício original de 1555. A igreja foi um dos prédios mais afetados pelo terremoto de 1746 e essa sim necessitou de reconstrução. A obra, supervisionada pelo jesuíta Juan Rehr, representa o estilo Herreriano, dentro de uma proposta renascentista. No seu interior, destacam-se os altares, as cadeiras do coro e a tumba de Francisco Pizarro.

Catedral

Catedral

 

Catedral

Catedral

O Palacio Arzobispal, ao lado da Catedral, data mais recentemente de 1924 e é obra do arquiteto polonês Ricardo Malachowski. Possui belíssimos balcões e fachada imponente.

Palacio Arzobispal

Palacio Arzobispal

Eram umas três da tarde e continuamos nosso passeio pelo Museo del Convento de San Francisco, uma igreja da ordem de São Francisco de Assis, a dois quarteirões da Praça Maior. Na época de sua fundação, no século XVI, o convento anexo à igreja abrigava cerca de 300 frades; hoje, por volta de apenas 35 religiosos ainda vivem enclausurados. Para mantê-los e continuar com suas atividades, o museu cobra uma “contribuição” de sete soles para entrar; o tour é guiado e o número de turistas limitado; assim, os visitantes ficam esperando em uma sala até que os grupos fechem a quantidade de pessoas indicada. O que todos esperam ver ali não é, na verdade, a decoração barroca da igreja ou o magnífico mobiliário do convento, embora eles sejam dignos da visita, mas sim suas sinistras e famosas catacumbas subterrâneas. Infelizmente, fotografias são terminantemente proibidas no interior dos prédios. Todas as que eu reproduzo aqui não são minhas e as encontrei na Internet. Como a maioria dos sites por mim utilizados eram também de viajantes blogueiros, não faço ideia de como foram tiradas, já que o guia fica com olhos de águia a qualquer fotografia furtiva. Eu não consegui nenhuma. Uma pena…

Em 1535, por indicação de Francisco Pizarro, a cidade de Lima já tinha uma área destinada à Ordem Franciscana dos Doze Apóstolos, onde o frei responsável ergueu uma pequena capela. Posteriormente, por volta de 1570, ela foi ampliada e ganhou o convento. No século seguinte, o conjunto de igreja e mosteiro foi reformado e luxuosamente decorado; porém, apesar da pompa externa, que o tornava um obra-prima da arquitetura colonial, suas fundações eram frágeis e sucumbiram ao terremoto de 1655. A reconstrução do complexo de San Francisco, sob a supervisão do arquiteto Português Constantino de Vasconcellos, começou logo depois da tragédia, em 1657. A nova igreja foi reinaugurada com festejos em 1672, mas a restauração do convento ainda prolongou-se até 1729.

O projeto do conjunto de San Francisco representa o padrão arquitetônico mais comum da época colonial, do século XVI: uma basílica com capelas e convento adjacentes. A planta consiste do convento, da Basílica Menor e das capelas Igreja da Soledade e Capela dos Milagres. A Basílica Menor recebeu o título do Papa João XXIII, em 1963, e sua fachada amarela, em estilo barroco colonial, é realmente muito bonita.

Museu e Convento São Francisco

Museu e Convento São Francisco

Do lado de fora, não se tem a verdadeira noção do tamanho do convento, sem considerar as igrejas; ele sozinho já é enorme, cheio de salas, claustros e pátios internos, também característicos da arquitetura colonial.

basílica e convento (reprodução de foto da Internet)

basílica e convento (reprodução de foto da Internet)

Nós iniciamos o passeio pelo interior do convento. Uma escadaria em U, coberta por uma abóbada, nos levou ao andar superior onde se encontra a biblioteca; o guia nos mostrou páginas de livros enormes que datam do século XV e exibem letras cuidadosamente desenhadas em Francês, Castelhano Antigo, Português, Quéchua e várias outras Línguas. A biblioteca preserva, entre 25 mil volumes, muitas obras raras, como mapas antigos, fotografias, pergaminhos, crônicas franciscanas, incunábulos e algumas das primeiras obras impressas no país. A biblioteca em si já é também uma atração; uma sala comprida, com mezaninos em madeira e escadas caracol, piso decorado, teto com aberturas para entrada de luz natural e belos lustres de cristal.

convento (reprodução de foto da Internet)

convento (reprodução de foto da Internet)

 

biblioteca (reprodução de foto da Internet)

biblioteca (reprodução de foto da Internet)

 

livros (reprodução de foto da Internet)

livros (reprodução de foto da Internet)

Ao lado da biblioteca, outra sala, a do Coro do Convento, chama atenção pelas inúmeras telas nas paredes e riquíssimo mobiliário. Nela, os religiosos se reuniam para discutir sobre seus assuntos relevantes e admirar o coro em 130 cadeiras, dispostas uma ao lado da outra, encostadas ao longo das paredes; cada encosto é detalhada e habilmente decorado com figuras e santos do catolicismo entalhados na madeira de cedro. Outras salas de reuniões do convento, como a Sala Capitular, possuem o mesmo tipo de decoração. O trabalho é, de fato, lindíssimo!

mobília do convento (reprodução de foto da Internet)

mobília do convento (reprodução de foto da Internet)

 

cadeiras da mobília (reprodução de foto da Internet)

cadeiras da mobília (reprodução de foto da Internet)

Seguimos para o pátio principal, com jardins simétricos e bem cuidados. Ao redor dele, as numerosas salas que antes serviam de aposentos aos franciscanos foram agora convertidas em museu. Esculturas barrocas entalhadas em madeira, pinturas a óleo em telas enormes e objetos sacros adornam cada aposento.

interior do convento (reprodução de foto da Internet)

interior do convento (reprodução de foto da Internet)

 

pátio interno (reprodução de foto da Internet)

pátio interno (reprodução de foto da Internet)

 

corredores do convento (reprodução de foto da Internet)

corredores do convento (reprodução de foto da Internet)

Em outros claustros, azulejos sevilhanos pintados com cenas diversas trazem inscrições de datas como 1620.

corredores decorados (reprodução de foto da Internet)

corredores decorados (reprodução de foto da Internet)

 

azulejos (reprodução de foto da Internet)

azulejos (reprodução de foto da Internet)

Um dos corredores ao redor dos pátios apresenta uma série de 39 telas que representam acontecimentos da vida de São Francisco. O guia nos explicava sobre algumas telas, especialmente as internas, que cobrem paredes inteiras e representam metáforas da vida religiosa. No Refeitório, por exemplo, no quadro “A Última Ceia”, o padre jesuíta Diogo de La Puente retratou a famosa cena com a presença inusitada de porquinhos da Índia, adaptando-a aos costumes locais.

Curiosamente, Michael e eu não entramos na basílica propriamente dita, pois ela estava fechada. Vi em fotos da Internet que sua decoração interna não difere muito de tantas outras igrejas espanholas e portuguesas do mesmo período.

iglesia de San Francisco (reprodução de foto da Internet)

iglesia de San Francisco (reprodução de foto da Internet)

De qualquer forma, todos nós esperávamos mesmo não era para ver o altar de outra igreja barroca, mas sim pela mórbida visita às catacumbas. Não tardou muito, iniciamos a descida aos subterrâneos do convento. A área das catacumbas compreende toda a extensão do monastério, sendo assim, bastante vasta. O local foi concebido para servir como um cemitério, a princípio dos religiosos do próprio convento e clero da cidade. Entretanto, ele também satisfez o descanso eterno de políticos, nobres e outros cidadãos limenhos.

As paredes do convento, assim como das catacumbas, são feitas de tijolos e uma mistura de areia, pedras, cascalho e clara de ovo. Muitas partes foram reconstruídas depois de um forte terremoto, como a abóbada central, mas ainda há paredes originais. Nos subterrâneos, as tumbas atingem os quatro metros de profundidade, mas a sensação claustrofóbica de um pé-direito baixo e de tijolos nus ainda existe.

capela (reprodução de foto da Internet)

capela (reprodução de foto da Internet)

 

catacumbas (reprodução de foto da Internet)

catacumbas (reprodução de foto da Internet)

 

catacumbas subterrâneas (reprodução de foto da Internet)

catacumbas subterrâneas (reprodução de foto da Internet)

O mais estranho das catacumbas de São Francisco é que as ossadas não se encontram separadas em gavetas ou túmulos distintos; mas estão misturadas umas às outras em tumbas abertas, vitrines ou mesmo pelo chão. Os ossos foram separados em crânios, fêmures, bacias e outros e dispostos nesse critério divisional para exposição. É bem estranho…

catacumbas sob o convento (reprodução de foto da Internet)

catacumbas sob o convento (reprodução de foto da Internet)

 

ossadas divididas (reprodução de foto da Internet)

ossadas divididas (reprodução de foto da Internet)

 

ossadas (reprodução de foto da Internet)

ossadas (reprodução de foto da Internet)

Um enorme fosso em forma de círculo nos atrai com um assustador arranjo de ossos acompanhando o mesmo desenho. São cerca de 30 mil pessoas enterradas nesse cemitério único e trabalhos de escavação ainda acontecem por lá.

fosso (reprodução de foto da Internet)

fosso (reprodução de foto da Internet)

 

fosso diferente (reprodução de foto da Internet)

fosso diferente (reprodução de foto da Internet)

 

ossos arrumados (reprodução de foto da Internet)

ossos arrumados (reprodução de foto da Internet)

Nós saímos do mórbido museu de São Francisco e continuamos nossa caminhada pela cidade. Alguns quarteirões depois, estávamos na Plaza Bolívar, logo em frente ao Congreso de La República. O edifício é bonito, mas a vizinhança das ruas próximas nem tanto.

Congresso e Praça Bolívar

Congresso e Praça Bolívar

Bem perto, decidimos entrar no Museo de La Inquisición y del Congreso, cuja entrada é gratuita, e uma senhora bastante simpática nos serviu de guia. Eu recomendo o tour pela importância histórica do edifício.

Museu da Inquisição em frente à estátua de Bolívar

Museu da Inquisição em frente à estátua de Bolívar

A temível Santa Inquisição atuou no Peru entre os anos de 1570 e 1820; a casa onde hoje funciona o museu foi sede dos julgamentos inquisitórios por um longo período de tempo e suas diversas salas foram, de fato, testemunhas dos atos atrozes da instituição que visava eliminar a heresia do âmago da Igreja Católica através de métodos nada humanos. A tortura era o principal elemento usado em supostos hereges a fim de que eles confessassem seus crimes cometidos contra a Igreja.

Com a independência do Peru, em 1821, o edifício se tornou a primeira Sede do Senado que, posteriormente, em 1939, transferiu-se para outro prédio, o Palácio Legislativo. As instalações foram, então, adaptadas para receber a Biblioteca Pública da Câmara dos Deputados. O museu da Inquisição foi somente criado em 1968 e hoje é um dos mais visitados do país. Além, então, de contar a história da mais abominável instituição da Igreja Católica, o espaço também é dedicado a preservar a memória do Poder Legislativo do Peru.

O tour se inicia pela Sala do Tribunal da Inquisição. Manequins apresentam uma reconstituição das audiências realizadas pelos representantes da Igreja, no período colonial. O teto detalhadamente marchetado e sem nenhum prego, com madeira vinda do Panamá, realmente impressiona.

no museu

no museu

No período republicano, esse mesmo ambiente se transformou na Sala de Sessões do Senado Nacional, onde parlamentares se reuniam para debater o futuro do país. Ao lado dela, está o Pátio Sevilhano, que traz uma placa com o nome do primeiro inquisidor, Serván de Cerezuela.

A Sala da Câmara Secreta da Inquisição era responsável por guardar os processos realizados pelo tribunal. Nela e nos outros aposentos seguintes, há mais manequins de tamanho real em situações simuladas de tortura, nos certificando da criatividade do Homem para fazer o mal. Na Câmara dos Tormentos, por exemplo, os réus eram torturados com instrumentos como o Potro; o condenado tinha pés e mãos amarrados e girados no sentido contrário, enquanto o castigo era supervisionado por um médico que obviamente não fazia nada. Já com a peça intitulada de La Garrucha, o prisioneiro era amarrado com os braços para trás, elevado por uma corda e solto bruscamente. As punições variavam de acordo com o “pecado” perpetrado.

tortura!

tortura!

Na Sala da Constituição, ainda se conservam as constituições políticas do Peru, desde a primeira, de 1823, até a atual, ratificada em 1993.

Eu destaco ainda quadros representando cenas inquisitórias. Na Sala dos Autos da Fé, um dos quadros mostra pregadores e oficias convidando a população para assistir às cerimônias organizadas pelo Tribunal da Inquisição. Outro retrata a realização de um auto de fé, uma cerimônia em que o condenado pela Inquisição era punido publicamente, na Plaza Mayor da cidade.

Há algumas paredes originais no prédio e elas estão bem destacadas do restante. O pórtico da fachada é inspirado na arquitetura greco-romana e medalhões retratam ilustres parlamentares do século XIX.

Depois do museu, fizemos o caminho de volta para o apartamento em Miraflores. Descobrimos que o tio cobrador do miniônibus nos enganara na vinda, pois a passagem era somente para ser 50 centavos de sol, ao invés de um.

Enfim, chegamos ao nosso quarto com os pés doendo de tanto caminhar. Porém, não ficaríamos descansando, mas programáramos um passeio com o Carlos.

Carlos chegou simpático e lindo com um sobretudo cinza para nos levar a um tour noturno pelo tradicional e boêmio bairro de El Barranco, ponto de encontro de estudantes universitários, jovens e artistas. El Barranco, um dos 43 bairros de Lima, é uma continuação de Miraflores, pela orla, e caracteriza-se pelo romântico ar colonial.

Miraflores e El Barranco (reprodução de imagem da Internet)

Miraflores e El Barranco (reprodução de imagem da Internet)

Em Barranco, há muitos restaurantes, bares e lanchonetes, como o Starbucks, e todos eles respeitam a decoração colonial convencionada. Há alguns casarões de tempos republicanos, mas a maior parte das construções é mesmo mais romântica e singela. Muitos designers, músicos, fotógrafos e poetas fazem do bairro sua casa, justamente pela atmosfera bucólica e ao mesmo tempo artística que ele oferece.

No século XIX, o lugar já era destino comum de férias e passeios da alta aristocracia limenha e o bairro, então, ainda conserva sua função de entretenimento. As suas praias estão entre as melhores da capital para o surfe e seus restaurantes entre os mais bem recomendados.

O nome Barranco é descritivo da sua topografia. As edificações se espalham ao longo de um morro, de onde é possível observar toda a faixa de areia que se estende desde Miraflores até Chorrillos, outro bairro limenho famoso por suas praias. No barranco, um gostoso caminho entre as casas coloniais, a Bajada de los Baños, nos leva a um mirante, cuja vista noturna da orla é excelente e pelas suas escadas chega-se até a avenida beira-mar.

Bajada de los Baños (reprodução de foto da Internet)

Bajada de los Baños (reprodução de foto da Internet)

 

mirante (reprodução de foto da Internet)

mirante (reprodução de foto da Internet)

Subindo pelo mesmo caminho, chegamos à Puente de los Suspiros, inaugurada em 14 de fevereiro de 1876. A ponte atravessa o morro e também proporciona uma boa visão da praia, além da simpática igreja Ermita. Com aniversário sempre no dia dos namorados, ela ainda é notório ponto de encontro de casais apaixonados. Ao iniciarmos a travessia da Ponte dos Suspiros, Carlos me indicou que eu fizesse um pedido e se conseguisse atravessá-la inteira sem respirar, seria atendida. Hum… O que será que eu desejei?

Ponte dos Suspiros (reprodução de foto da Internet)

Ponte dos Suspiros (reprodução de foto da Internet)

 

ponte em El Barranco (reprodução de foto da Internet)

ponte em El Barranco (reprodução de foto da Internet)

 

Iglesia Ermita (reprodução de foto da Internet)

Iglesia Ermita (reprodução de foto da Internet)

Num pequeno parque próximo à ponte e à igreja, há uma estátua em homenagem a Chabuca Granda, famoso cantor e compositor nascido no bairro. Transbordando música e arte, El Barranco é ainda lar de muitos museus, como o MAC – Museu de Arte Contemporânea e o Museo Pedro de Osma, que alberga obras coloniais.

igrejinha em El Barranco (reprodução de foto da Internet)

igrejinha em El Barranco (reprodução de foto da Internet)

Como era noite e não queríamos mais entrar em museus por algum tempo, acabamos mesmo em um bar, o La Noche de Barranco. Conversamos e vimos vários shows pequenos de poetas locais. Eu não entendi nada, mas valeu pelo local, que era bem agradável e, lógico, pela companhia. Ah… A paquera… Que momento divinamente delicioso! O roçar de joelhos por baixo da mesa, como se não houvesse intenção, as risadas sinceras de piadas sem graça, os olhares discretos, a expectativa do melhor da vida. A expectativa…

Embora eu tivesse sentido reciprocidade, nós éramos três naquele instante. Minha timidez impedia um avanço mais direto e, assim, quando Michael propôs que fôssemos embora, pois ele estava cansado e de fato o dia fora exaustivo, eu o acompanhei. Carlos protestava, alegando ser ainda muito cedo e que deveríamos aproveitar mais a noite, já que ele até transferira o seu turno de trabalho da manhã seguinte para a tarde. Sem coragem de sugerir que nós dois saíssemos sozinhos, mesmo com aqueles olhos negros me encarando e dizendo indiretamente para eu ficar, voltei e, antes da meia-noite, já estávamos no apartamento de Miraflores. Hum… Se arrependimento matasse…

No dia 14 de agosto, por indicação do próprio Carlos, visitamos o sítio arqueológico de Pachacamac, a cerca de 30 km do centro de Lima, na margem direita do Vale de Lurín. Na rua do apê do Gian, em frente ao Parque Mora, aquela praçinha simpática rodeada de prédios residenciais muito agradáveis, nós pegamos uma combe até a Avenida Alfredo Benavides, por 1,50 sol. Nesse caminho, uma Lima progressista e moderna ia novamente se revelando a cada segundo; a Benavides é uma avenida cheia de lojas de pé direito alto e muito bem decoradas, lanchonetes de fast food famosas e um comércio fortíssimo. Eu também me surpreendia com a quantidade de praças, jardins e canteiros floridos da capital, apesar do clima desértico da cidade. Tudo muito limpo e bem cuidado! No bairro Sucre, por exemplo, havia muitos arbustos podados com formas inusitadas, como gatos e outros animais e na Via Expressa, gramados bem aparados exibiam propagandas com nomes de empresas formados com plantas de outros tons de verde. Eu realmente fiquei muito impressionada com a beleza e organização de Lima.

Quando avenida termina, há a ponte Benavides, que cruza a estrada Panamericana Sur, via de entrada e saída de Lima. Temos que descer ali e ir para baixo da ponte, na estrada. Nesse ponto, vários ônibus vão diretamente para Pachacamac, por 3,50 soles. A partir daí, como tudo não são flores, já podemos enxergar algumas favelas grandes e simples conjuntos habitacionais. Essa periferia desanimada e enfraquecida, eufemisticamente chamada de “asientamentos humanos” (“barrios populares” na Colômbia e Venezuela, “villas” na Argentina e “comunidades” no Brasil) nos fez lembrar a nossa realidade de grande cidade sul-americana, com suas inevitáveis favelas.

Apesar de curta, a viagem dura cerca de uma hora. Na entrada do complexo, o ingresso de oito soles inclui a visita ao templo e também ao museu.

Pachacamac foi um centro cerimonial dedicado à divindade mais importante da costa peruana, antes da dominação inca, Pacha Kamaq (o deus criador do universo e oráculo que previa o futuro). As primeiras ocupações da área se iniciaram no ano 200 a.C., com a cultura Lima, seguida da dominação Wari, por volta de 650 d.C, e Ychma, em 1200 d.C. Os incas chegaram ao vale ao redor do ano de 1450 d.C. e estabeleceram novos centros administrativos, adequando as construções pré-existentes às novas necessidades. Pachacamac conta com 17 pirâmides, templos, palácios e praças que, portanto, foram sendo, ao longo de séculos, modificados e acrescidos por quatro culturas diferentes. De modo geral, Pachacamac foi destino de peregrinos por mais de 1500 anos, nos grandes rituais religiosos andinos.

Nós andamos por cerca de 10 km dentro de Pachacamac, iniciando o tour pelo museu, onde observamos cerâmicas e imagens de ídolos de características zoomórficas desenterrados da região, assim como peças decoradas com motivos marinhos, como conchas e peixes. No complexo, traços das quatro civilizações podem ser observados.

No Complejo de Adobitos, construção mais antiga de Pachacamac (200 – 650 d.C.), a função era administrativa. Composto por plataformas superpostas e cinco recintos quadrangulares, o edifício foi edificado com adobe, segundo uma técnica chamada de “del librero”, na qual os tijolos de barro são colocados na vertical deixando um pequeno espaço entre eles, com a missão de tornarem a edificação mais flexível no advento de sismos. Essa técnica construtiva foi utilizada em todo o Peru, ao longo dos séculos seguintes. A área do Complejo de Adobitos, durante a época ychma, foi usada como cemitério.

O Templo Viejo também é uma das construções mais antigas e remete à cultura Lima (200 – 650 d.C).

Por volta do ano de 650 da era cristã, os wari iniciaram sua expansão desde Ayacucho até a região de Lima. Nessa época, o santuário de Pachacamac alcançou seu primeiro esplendor. O extenso cemitério, escavado por Max Uhle em 1896, data desse período. O cemitério encontra-se aos pés e embaixo do Templo de Pachacamac (Templo Pintado), assim como uma série de oferendas em cerâmica encontradas na área. A sociedade wari, caracterizada pelo estilo policrômico da serra Ayacuchana, influenciou poderosamente a arte na costa peruana.

Em seguida à queda dos wari, a civilização ychma (900 – 1470 d.C.), que significa “urucum” em Quéchua (fruta que dava um corante de uso corporal), toma conta de Pachacamac. Abarcando os vales de Lurín e Rimac, os ychmas lograram a unificação política da região, cuja capital foi considerada Pachacamac. Nessa época, se construíram várias pirâmides com rampas, na zona central do santuário, separadas por duas avenidas que dividem o espaço em quatro setores: uma tem direção norte-sul e outra leste-oeste. As pirâmides com rampas eram construções monumentais que funcionavam como centros administrativos ou possíveis palácios, para cerimônias públicas, e foram identificadas 17 edificações semelhantes dentro de Pachacamac. Os edifícios são elevados e compostos de várias plataformas superpostas, às quais se alcançam através de uma rampa central localizada em frente a um grande pátio. Dentro, há vários depósitos subterrâneos, salas e corredores.

pirâmide com rampa

pirâmide com rampa

A avenida Norte-Sul, obra da cultura ychma e principal rota de circulação interna entre várias das pirâmides com rampas, vem sendo investigada desde 2009 e 160 metros já foram limpos pelos arqueólogos. Durante a ocupação inca, esta rua continuou sendo usada e algumas modificações foram feitas. A via, assim como outras estruturas do complexo, foi enterrada por escombros de um terremoto em épocas coloniais e o santuário foi abandonado.

avenida Norte-Sul

avenida Norte-Sul

Além de pequenas modificações, os incas também fizeram substanciais contribuições a Pachacamac (1470 – 1533 d.C.). Segundo os historiadores espanhóis, o inca Túpac Yupanqui conquistou a região, em 1470, e ordenou a construção do Templo del Sol na área mais importante do entorno, sobre antigas estruturas da época Lima. O edifício de forma trapezoidal possui plataformas escalonadas e podia ser visto a longas distâncias, dada sua posição no alto, de frente para o mar, e a cor vermelha de suas paredes. Desde 2010, programas do Ministério de Cultura Peruano vêm estudando e preservando o Templo do Sol. De acordo com os arqueólogos, o templo, símbolo do domínio inca, era local de oferendas e sacrifícios aos deuses.

Templo do Sol

Templo do Sol

 

Templo do Sol

Templo do Sol

 

Templo do Sol

Templo do Sol

 

paredes vermelhas no Templo do Sol

paredes vermelhas no Templo do Sol

Os incas edificaram ainda o Templo de las Mamaconas, em estilo inca imperial com as características portas trapezoidais, lugar de residência das mulheres escolhidas e dedicadas a culto. Os incas subordinaram o antigo oráculo, adaptando-o aos seus próprios fins.

Mamaconas Pachacamac

Mamaconas Pachacamac

O Palácio Tauri Chumpi, também da época inca, era um edifício residencial. Nele, havia praças, salas, depósitos e outras estruturas comunicadas entre si por corredores e rampas. Segundo historiadores, à chegada dos espanhóis a Pachacamac, o principal administrador do santuário vivia nesse palácio e era responsável pela distribuição de bens e recursos do vale, assim como o gerenciamento dos cultos à população.

Além de hábeis construtores, os incas também surpreendiam por seus métodos matemáticos. Os administradores incas utilizaram um engenhoso sistema contábil e de registros denominado Quipu, que consiste em uma corda principal, da qual pendem cordas com nós ordenados sistematicamente, que guardavam informações de censo e registros estatísticos diversos. Como capital do reino, Pachacamac recebia muitos bens, como tributos dos súditos e oferendas aos deuses; assim, os sistemas administrativos de controle se sofisticavam a cada ano. Quase todos os quipus do museu foram encontrados em uma sala de Pachacamac.

Poços, aquedutos e fontes para abastecimento de água do complexo também foram identificados em Pachacamac, além de paredes, no Templo Pintado, com pinturas e desenhos de peixes, aves, plantas, homens e possivelmente o “Ídolo de Pachacamac”. O Templo Pintado ainda exibe figuras vermelhas e amarelas delineadas em preto e na plataforma em seu topo foi encontrada uma imagem talhada em madeira do deus de Pachacamac. O edifício permaneceu em funcionamento até a chegada dos espanhóis ao santuário e estudiosos acreditam que a construção foi o verdadeiro oráculo de Pachacamac.

Ficamos, porém, infinitamente decepcionados com a quantidade absurda de pedras riscadas e depredadas por vândalos. São pichações variadas e coraçõesinhos com nomes de casais que podem atestar o amor entre dois amantes, mas certamente asseguram a falta de amor à arte e à história. É uma pena! Hoje, há muitos seguranças guardando os perímetros de Pachacamac, certificando-se de que o cuidado com o patrimônio histórico esteja sempre presente. Porém e infelizmente, o estrago já foi feito e nem um processo pesado de restauração conseguirá apagar a ignorância cometida. Por anos, o complexo ficou aberto e à mercê dos moradores das favelas do entorno e só recentemente (anos 2000) vem sendo estudado e protegido.

comunidade muito perto

comunidade muito perto

 

vergonha!

vergonha!

Por volta das quatro da tarde, depois de almoçarmos na rua, nós já estávamos de volta a Miraflores. Decidi descansar, mas ainda sentia que minha história com o limenho gato ainda não tinha terminado. Com toda a coragem que a tela do computador nos dá, dei uma incerta pelo Facebook me convidando pra sair sozinha com ele. Que delícia! Já conheço bem a empolgação “pré-conquista” (ou em Português explícito: “pré-coito”); um “claro que sim” mais do que rápido, duas mensagens de confirmação, um e-mail avisando sobre um possível atraso e emoticons cheios de sorrisos. Conforme me foi narrado, depois daquela tarde e da noite inteira de trabalho, ele saíra afobado correndo para casa, tomara um banho e viera o mais rápido possível me pegar, lá pelas onze e quarenta da noite. Sem subterfúgios ou saídas elegantes, ele aceitara prontamente o meu convite e eu, então, cresci na confiança da reciprocidade. Afinal, se ele simplesmente quisesse arrumar alguma desculpa, poderia agradecer a proposta, mas recusá-la educadamente, com a plausível justificativa de trabalhar até de madrugada, já que todos nós sabíamos que ele trocara seus horários no dia anterior para poder sair conosco. Enfim, correspondi ao entusiasmo certeiro esperando durinha e arrumadinha na frente do espelho (e com duas camisinhas no bolso). Cumprimentos educados concedidos, fomos ao centro de Miraflores passear. Conversa vai, conversa vem, uma hora se passou como um minuto… Falamos sobre mal de amor e rimos muito até começar a garoar; a inibição de ambos nos impedia de tornar a vontade latente realidade até o ponto de eu duvidar dos meus instintos anteriores; mas não, era só acanhamento mesmo e quando eu ameacei ir embora, ele finalmente decidiu agir, revelando que também nunca tomava iniciativa. Já que ele morava com a mãe e a irmã, fomos a um hotel nas proximidades, de onde saímos umas quatro da manhã.

Infelizmente, são em momentos como esse que percebemos se estamos de fato fortes ou se resquícios da depressão ainda podem nos ameaçar. Viajar sem dúvida faz parte da cura e a distração de conhecer tantos lugares e tanta gente é certamente um fator positivo para que voltemos a ficar confortáveis com nossos próprios pensamentos. Porém, e aí que reside a desgraça, apesar de toda diversão consciente e desejada que a viagem e todo o sexo sem compromisso que ela proporcione possa nos trazer, às vezes as coisas não ficam assim tão claras. Percebi que tinha gostado dele mais do que deveria e não estava ainda muito segura e confiante para enfrentar a rejeição novamente. Quando, então, carinhosamente ele desfez nossa “conchinha” com a desculpa de trabalhar cedo, confesso que a sensação não foi nada boa. Amoroso e muito gentil, ele continuou um cavalheiro até quando me deixou em casa e esperou que eu entrasse no prédio, com direito até a tchauzinho e beijinhos de longe. Prometeu me encontrar na tarde seguinte para que fôssemos ao Centro Histórico ver as luzes noturnas e que jogaria futebol depois… “Futebol”… Nossa, onde estava todo o entusiasmo do dia anterior? E ainda, onde estava a minha própria clareza de pensamento? Eu é quem tinha saído com camisinhas no bolso; o que eu esperava? Juras de amor eterno? Ai ai…

Às vezes, a mente feminina é algo muito incoerente e não pude evitar a confusão de sentimentos e ficar com a pulga atrás da orelha; como meus pressentimentos costumam estar corretos, a decepção veio pela Internet, dia seguinte, numa mensagem fria com uma desculpa esfarrapada que desabou meu ingênuo castelinho de um “namoro a distância que levasse a algo mais sério”. Sua supervisora teria supostamente faltado por causa de uma forte gripe e ele mesmo também estaria sofrendo de dores de cabeça fortes e ainda trabalharia até mais tarde, sem poder, então, me acompanhar ao Centro Histórico à noite. Adeus encontro e adeus qualquer chance… Acho que eu deveria ter usado outro verbo quando cruzei a Ponte dos Suspiros… Algo assim mais perene…

De certa forma, esse fato me influenciou negativamente no decorrer das próximas semanas. Ainda que eu adore viajar, eu já estava cansada dos três meses na estrada e, em retrospecto, concluo que esse desgaste vinha exatamente do fato de eu não estar totalmente bem. Eu amo entrar num ônibus ou num avião a caminho do desconhecido e, como afirmei, viajar é verdadeiramente uma oportunidade de autoconhecimento e possibilidade real de melhora para qualquer tipo de tristeza. Entretanto, esse processo pode não ser tão rápido e é possível que tudo de ruim volte a partir do momento que retornemos à rotina de casa. Nessa perspectiva, a viagem pode ser até comparada a usar drogas, ou seja, ela pode apenas funcionar como uma temporária energia, um embuste de melhora, já que os problemas continuam dentro de nós (eles também se “distraem”, mas permanecem ali, conosco). Não me admira que muitas pessoas se “viciem” em viajar, sintoma de uma patologia que tem até nome complicado: “ecdemomania”. Então, acredito que o fato de partir para o mundo possa ser o melhor dos remédios e um aliado eficaz contra a depressão, desde que também consigamos nos abrir para uma análise franca sobre o que de fato nos faz mal, desde que a viagem não seja somente uma “fuga”, mas um dos alívios no caminho da cura. Viajemos pelos motivos certos e não pelos errados…

No meu caso, era inegável o bem que a jornada pela América do Sul estava me fazendo, mas mesmo assim a raiz dos meus problemas não era assim de tão simples solução e na primeira ocasião que eles foram postos à prova, eu me abalei um pouco… Tive vontade de voltar pra casa, ao mesmo tempo em que tive vontade de sumir no mapa. Já estava me sentindo cansada.

Enfim, apesar dos pesares, não me senti tão mal quando Carlos me enviou mensagens sinceras de nos vemos no Brasil, durante a copa, em 2014. Cheguei até a cogitar a possibilidade de passar um tempo maior no Peru, para que nos conhecêssemos melhor, mas a ideia não vingou. Hoje, ele namora e está feliz; fala eventualmente comigo quando está online e eu não espero mais nada dele. Se for para tirar algo de bom de qualquer experiência, percebi que estava viva e pronta pra outra!

No dia 15, então, ainda que um pouco decepcionada com o final da noite anterior, segui com nossos planos normalmente. Eu estava determinada a agir positivamente, aceitando minha sorte de poder viajar; queria enxergar o “copo meio cheio” e não “meio vazio”. Assim, Michael, Giancarlo no seu dia de folga e eu levantamos tarde, tomamos café e saímos pra passear.

Fomos até a Huaca Pucllana, templo que ocupa apenas um quarteirão ali mesmo em Miraflores, mas não entramos. Estávamos um pouco cansados de huacas e decidimos só vê-la de fora. Grades a separam das ruas e, dessa forma, já é possível se ter uma ideia do que há dentro. A Huaca Pucllana foi erigida por uma civilização pré-inca e destinava-se a um local de adoração e sacrifícios dos nobres da sociedade. Arqueólogos estimam que o espaço do templo, cuja maior parte ainda encontra-se soterrada, deva compreender muitos quarteirões do entorno; porém, os edifícios de Miraflores já estrangularam a huaca e na década de 80 a área era até usada – acreditem se quiser – como pista de MotoCross. Os trabalhos de restauração ainda durarão muitos anos e os esforços serão significativos, a fim de descobrir o que a cidade moderna enterrou.

Huaca Pucllana

Huaca Pucllana

 

técnica do livro na construção da Pucllana

técnica do livro na construção da Pucllana

Em seguida, caminhamos mais até o centro de Miraflores, a fim de encontrarmos um restaurante mais econômico onde almoçar e, logo depois, andamos até Santo Antônio, outro distrito de Miraflores. Visitamos nele a amabilíssima mãe do Giancarlo, senhora que ama o Brasil e venera nossas novelas. Retornamos ao centrinho novamente e tomamos um ônibus de volta ao apartamento. Eram umas quatro da tarde e, na Net, confirmei minha sensação de mal-estar com a mensagem seca de desculpas do Carlos. Fiquei bem chateada, mas continuamos os tours com Gian.

À noite, o anfitrião nos levou ao Parque das Águas. De táxi, passamos pelo bairro San Isidro, centro financeiro de Lima e um dos melhores locais para se viver da capital. Colado a Miraflores, San Isidro mantém a beleza e o clima de atualidade do bairro vizinho com avenidas arborizadas, cheias de palmeiras, chiques prédios residenciais, mansões, campos de golf, grandes empresas, corporações e shoppings badalados. Segundo Gian, a maioria dos artistas da TV mora em San Isidro. É realmente maravilhoso! Ainda víamos bandeiras peruanas nas varandas dos apartamentos e nosso amigo nos explicou que, devido à independência do Peru, em 28 de julho, é obrigatório por lei o uso e hasteamento de bandeiras nas casas durante o período de festas pátrias.

O Circuito Mágico del Agua – Parque de La Reserva é uma das principais atrações turísticas de Lima e atrai centenas de visitantes todos os dias. O ingresso foi de quatro soles.

Inaugurado em 1929, foi batizado como Parque da Reserva em homenagem aos reservistas que defenderam Lima, na ocasião da Guerra do Pacífico. Posteriormente, a área passou por um período negro de deterioração e abandono e, na década de 90, encontrava-se completamente dilapidada. Finalmente, o circuito foi restaurado e, em julho de 2007, reinaugurado como mais um dos símbolos da Lima moderna. Hoje, é ponto de encontro dos moradores que se preocupam cada vez mais com sua qualidade de vida e cercam-se de parques, praças e muitas flores.

O parque traz um museu no qual são dispostas, sobre as paredes de um túnel subterrâneo, informações sobre o aproveitamento da água na região desértica de Lima e curiosidades sobre o líquido da vida ao redor do mundo. Tudo é muito organizado e bem estruturado, de impressionar mesmo. Achei curioso o fato de Lima ser a segunda maior cidade do mundo construída sobre um deserto, atrás de Cairo, no Egito.

Parque das Águas (reprodução de imagem da Internet)

Parque das Águas (reprodução de imagem da Internet)

O ponto forte do parque, porém, são os chafarizes, treze no total. Muitos construídos só para se admirar e outros interativos, nos quais entramos em túneis d’água ou pulamos fontes circulares que revezam sua altura; as crianças adoram e devemos estar preparados para nos molhar!

Parque das Águas

Parque das Águas

 

Parque das Águas

Parque das Águas

Os diversos chafarizes, em meio a jardins belíssimos, esbanjam criatividade em formatos inusitados, luzes e fontes dançantes. Alguns são enormes e têm inclusive sua grandiosidade registrada no Guinness, o livro dos recordes. É importante atentar para os horários de funcionamento do parque, que abre de quarta a domingo, das 16h00min às 23h00min, e também das atrações dentro dele. A Fonte da Fantasia, por exemplo, apresenta um show de luzes, cores, projeções de vídeo e efeitos de laser todos os dias, a partir das sete da noite; nessa apresentação, são mostradas, através das diversas fontes de 20 metros de altura arranjadas em um espelho d’água de 120 metros de comprimento, danças típicas peruanas com ritmos nativos. Outras exibições também acontecem periodicamente, mas as águas dançantes bailam sincronicamente ao som de música clássica. O parque é bonito de dia, mas a magia das cores, sons e efeitos de imagem é mais bem observada à noite. Infelizmente, nós perdemos o horário do show e não tínhamos tempo de esperar pelo próximo; assim, sugiro realmente prestar atenção ao relógio.

Fuente de la Fantasía (reprodução de foto da Internet)

Fuente de la Fantasía (reprodução de foto da Internet)

 

Fonte da Fantasia (reprodução de foto da Internet)

Fonte da Fantasia (reprodução de foto da Internet)

A Fonte Mágica, maior do parque, tem 80 metros de altura e a Arco-Íris é uma das mais bonitas.

Fuente Mágica (reprodução de foto da Internet)

Fuente Mágica (reprodução de foto da Internet)

 

Fuente de la Armonía

Fuente de la Armonía

 

Fuente de la Cúpula Visitable

Fuente de la Cúpula Visitable

 

Arco-Íris

Arco-Íris

Saímos do Parque das Águas e caminhamos novamente umas vinte quadras até o Centro Histórico, para ver a Praça de Armas iluminada à noite o que é, de fato, lindo.

Eu estava particularmente irritada pelos acontecimentos recentes e gostei quando pegamos o ônibus metropolitano para voltar. Tínhamos também andado exaustivamente e estávamos cansados.

No dia seguinte, sairíamos de Lima, rumo à cidade de Pisco. Da capital, não exploramos os famosos museus, já que estávamos um pouco saturados de exposições. Entretanto, deixo aqui as dicas do Museu Arqueológico Larco Herrera, célebre pela coleção de arte erótica, e o Museu Nacional de Arqueologia, Antropologia e História do Peru, cujo acervo abrange a história de vários dos povos que fizeram do Peru um país riquíssimo culturalmente. Ambos ficam no bairro de Pueblo Libre, um pouco afastado de Miraflores.

Dia 16 de agosto, saímos cedo junto com Gian, que ia para o trabalho. As despedidas do novo amigo foram sentidas e prometemos nos rever. Eu absolutamente amei Lima! Quando eu leio relatos que rebaixam a capital peruana ao status de qualquer metrópole bagunçada e pobre da América do Sul, eu honestamente não compreendo. Achei, de um modo geral, Lima bonita, limpa e moderna. Evidentemente, não estamos na Europa e partes da cidade apresentam problemas; porém, eu realmente não esperava uma cidade tão boa assim no Peru. E, de fato, a capital contrasta muito com o restante do país onde, realmente, as cidades oferecem aquela atmosfera simples e as doenças típicas do nosso “mundo em desenvolvimento”. Quanto a Lima, eu poderia morar lá sem problemas.

Em nossa passagem pela cidade, evitamos ao máximo os táxis, que são muito mais caros na capital. Porém, carregados de mochilas e do “morto” inseparável, pegamos um táxi até a empresa de transportes PerúBus S.A. (Terminal da Soyuz), indicada por Giancarlo. Compramos as passagens, por 34 soles cada, para Pisco na mesma hora, para o próximo ônibus das 8h30min e esperamos pouco tempo.

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