Boa Vista (Brasil) – Pacaraima (Brasil) – Santa Elena de Uairén (Trek ao Monte Roraima)

Boa vista (Brasil) – Pacaraima (Brasil) – Santa Elena de Uairén (Trek ao Monte Roraima)

Começamos nossa aventura dia 16 de maio de 2012, tomando o avião, em São Paulo, rumo a Boa Vista, capital de Roraima. Eu, particularmente, já tinha vindo dia anterior de Navegantes, em Santa Catarina; dormi em São Paulo e, dia 16, levantamos às 4 da manhã para seguir ao aeroporto. Nosso voo saiu, no horário, às 07h20min da manhã, com conexões em Brasília e Manaus, e chegou a Boa Vista às 13h50min, horário local. Na realidade, o voo, contando as conexões e as esperas, durou cerca de cinco horas; porém, com a diferença de fuso horário de Boa Vista, descemos na cidade por volta de duas da tarde. Do próprio aeroporto, tomamos um táxi até o Terminal Intermunicipal do Caimbé (terminal de táxis- lotação), por R$ 30,00. Desse terminal, que fica a alguns quilômetros do aeroporto, é possível pegar um carro-lotação de Boa Vista até Pacaraima (cidade limítrofe na fronteira com Venezuela) e ir ainda até Santa Elena de Uairén, já em território venezuelano. Tomamos, então, um dos táxis-lotação dentro do Terminal do Caimbé e o motorista ainda rodou algumas ruas a fim de pegar mais passageiros para encher o carro.

Ao andar por Boa Vista, me surpreendi com a singeleza da cidade. A capital de Roraima tem apenas 284 mil habitantes; preponderam as ruas de terra e os sobrados. Vi pouquíssimos edifícios e vias asfaltadas, salvo a avenida principal, que está sempre amarronzada da terra vinda das transversais, e a rodovia. De modo geral, senti Boa Vista como uma simples cidade de interior, com praças, comércio popular, muito pó e a maioria das pessoas de chinelos. Fiquei um pouco surpresa por tratar-se de uma capital de estado. O próprio aeroporto é bem pequeno e básico, deixando a atmosfera da cidade vagarosa e não estressante.

Saímos, então, de Boa Vista com o táxi-lotação e chegamos a Pacaraima por volta das 17h30min. São umas três horas de viagem. Pacaraima é uma cidadezinha pobre, feia e empoeirada; deixamos lá uma das passageiras e seguimos para Santa Elena de Uairén, parando antes na polícia da fronteira para carimbarmos nossos passaportes. O processo já é de praxe para esses taxistas que fazem Brasil – Venezuela.

O caminho entre as cidades é predominantemente de planície e, mais ou menos, uma hora e meia depois de Boa Vista, começa a subir até cerca de 1200 m, até Santa Elena. Às seis da tarde, meia hora depois, já estávamos na pequena cidade de Santa Elena de Uairén, na Venezuela.

Surpreendentemente, havia certo trânsito e, então, já perto de anoitecer, chegamos ao hotel que havia sido recomendado pelos mochileiros (www.mochileiros.com). O taxista o encontrou facilmente, dado o tamanho pequeno da cidade e a concentração dos hotéis e agências de viagem naquela determinada rua e região. Em Santa Elena de Uairén não há albergues, mas somente hotéis; assim, nos registramos em um quarto privativo no simples e colorido hotel Michelle (Calle Urdaneta – Puerto Libre – Santa Elena de Uairén Municipio Gran Sabana – Estado Bolívar – Venezuela/ (58) 289 416 12 57). O Michelle é um hotel com cara de albergue; dá toalhas e tem quartos com banheiros privativos, porém também oferece serviços típicos de albergues, como cozinha e guarda bagagens. Tudo é muito modesto e a limpeza deixa definitivamente a desejar; para usar, por exemplo, os escassos utensílios de cozinha, como uma frigideira velha, na qual queríamos preparar o café da manhã, precisamos ferver água nela para que ficasse com mínimas condições de uso. Há a cozinha, então, mas eu não diria que se pode cozinhar nela grandes refeições confortavelmente; não há espaço limpo para trabalhar, não há suficientes utensílios, o fogão tem tanta crosta que o fogo mal sai das bocas, a pia é imunda e, inclusive, dividimos o cubículo com uma barata morta num canto por uns três dias, pelo menos, enquanto ninguém a limpava. Entretanto, não se encontrarão, nessa cidade, outros hotéis mais diferentes que esse ou de qualidade superior. Além disso, o Michelle tem Internet WIFI, pessoal solícito e conta com boa localização; na mesma rua, há diversas agências de viagem, outros hotéis com restaurantes e está pertíssimo do centrinho. Ademais, ele é bastante econômico, com diárias de 70 bolívares para quarto single e de 100 bolívares para um quarto duplo. Numa viagem longa assim, na qual a economia é primordial, há que se contentar, na maioria das vezes, com apenas uma cama para esticar o corpo, lugar para guardas as mochilas e, quando há muita sorte, um chuveiro decente para um bom banho… Despir-se de qualquer exigência de conforto e luxo é fundamental.

Nessa mesma noite, o Michael, meu amigo e companheiro de viagem, foi trocar reais por Bolívares Fuertes, a moeda da Venezuela. O taxista que nos trouxe de Boa Vista, no táxi-lotação, fora pago em reais (R$ 30,00 por pessoa), mas precisávamos acertar o hotel, sair para comer alguma coisa e comprar algo no mercado. Em Santa Elena de Uairén, há um local chamado de Esquina dos Quatro Cantos que é, obviamente, a convergência de quatro esquinas na rua principal da cidade. Aí, há a concentração do comércio popular, padarias e casas de câmbio e ainda os cambistas de rua, sentados mansamente em banquinhos de madeira e captando turistas com olhos de águias. Assim que passam, oferecem o câmbio monetário. Em Santa Elena, é seguro trocar o dinheiro nas ruas. Porém, para grandes quantidades, há que se preferir os pequenos escritórios fechados que são facilmente apontados na mesma esquina. Dinheiro trocado, fomos procurar o que jantar.

Já que ainda estávamos um pouco desorientados, a escolha mais óbvia foi um pequeno restaurante ao lado do hotel. Enquanto comíamos nossa primeira refeição venezuelana, uma sem graça macarronada bolonhesa, super melhorada com o sabor da fome, notamos uma comoção na rua; pessoas entraram correndo das mesas de fora e fecharam as portas, assustadas, olhos arregalados, enquanto pudemos ouvir os roncos bravos e enérgicos de dezenas de motocicletas, num buzinaço e gritaria geral.

Santa Elena de Uairén, capital da Grand Sabana, é uma cidade de mineiros. Como ela também é ponto de partida de passeios para o Monte Roraima, Gran Sabana, Canaima e outros, o turismo também está ganhando destaque. Porém, ela é predominantemente uma cidade que vive do trabalho nas minas e da extração de diamantes. Na explicação da garçonete, entendemos justamente que os mineiros protestavam contra o fechamento de minas pelo governo e haviam começado negociações com o mesmo naquela exata semana. Isso nos atrapalhou por alguns dias, já que os protestos bloquearam a estrada rumo ao Monte Roraima. Detalharei mais a seguir.

Encerramos o dia dormindo cedo e ansiando pelo começo oficial de nossa aventura, no dia seguinte. Dia 17 de maio amanheceu com a ideia de procurarmos agências de viagem que promovessem o trekking de seis dias ao Monte Roraima. Na mesma rua do Michelle, há três agências que basicamente fazem os mesmos passeios, com as mesmas variações: a Mystic, a Backpakers e a Kamadac. Elas ainda estavam fechadas quando acordamos; dessa forma, decidimos caminhar um pouco pelas ruas da cidade e procurar outra agência que também fora apontada no site dos mochileiros. É fácil andar em Santa Elena, tudo é perto de tudo e o tempo estava bom. Pedimos orientações para um hotel e agência de viagens chamado Toñita, que encontramos facilmente, a algumas quadras do Michelle. O aspecto não era nada profissional, uma casa simples, mal pintada e de decoração brega, que abusava das flores de plástico e de toscos bibelôs de cerâmica e de cuja porta, depois que batemos palmas, saíram uma velhinha magricela e a empregada com vassoura em punho. As duas muito meigamente nos informaram que a pessoa responsável estava em tour e, por isso, nada podiam fazer. Cada vez eu tenho mais dúvidas sobre quem está errado: se eu, com minha postura de paulista nervosa que crê ser inadmissível que um local que ofereça um serviço dispense assim dois potenciais clientes por não haver ninguém disponível a dar informações ou se eles, que já “ganharam o pão do dia” com os mochileiros do passeio atual e, de modo nada estressado, só vão pensar em captar mais viajantes na volta… É um calmo “Deixa a vida me levar…” mesmo.

Assim, retornamos ao nosso hotel, onde encontramos um francês e um australiano interessados no mesmo tour. Os dois já tinham feito contato com um tal de “Chico”, que viria dar informações sobre o trekking ao Monte Roraima à tarde, no próprio Michelle. Decidimos, então, aguardar com eles, sem antes almoçar num mercadão do centrinho o que seria a “ração” da nossa viagem: “pollo a la plancha” – peito de frango na chapa, com arroz, feijão, banana assada e salada, o prato mais básico e barato que encontramos na Venezuela. De volta, a reunião com o Chico foi bastante clarificante. Ele nos deu um cartãozinho de sua agência – Francisco Alvarez – cujo escritório ficava na rodoviária e nos explicou, detalhadamente, como era dividido o trekking, preços e necessidades da aventura.

Trek ao Monte Roraima – Relato da perspectiva de uma inexperiente sedentária!

O que é necessário:

Os preços e os tipos do trekking ao Monte Roraima basicamente variam pouquíssimo de agência para agência. Tanto na do Chico, como nas outras, teríamos a possibilidade de escolha de três opções de trekking: a primeira com tudo incluso; a segunda, um “modelo básico”; ou ainda a terceira, a super opção “desprovida de tudo”, na categoria “se vira sozinho”. O período do passeio também pode variar de 6 a 8 dias, sendo seis a opção mais viável e indicada.

Na primeira escolha, cada um deve carregar sua própria mochila com roupas, itens pessoais e equipamento de camping, tais como isolante térmico, saco de dormir, lanterna, bastão de caminhada e garrafa d’água. Porém, as barracas – dadas pela agência -, toda a comida (25 kg por pessoa), fogareiro, utensílios como copos, talheres, pratos, “banheiro”, etc. ficam a cargo dos carregadores. Nesse caso, os guias/carregadores também cozinham e montam as barracas nos acampamentos e, se você não levar isolante ou saco de dormir, eles, através da agência, também podem fornecer; mas novamente, esses dois últimos itens, o mochileiro carrega.

Na segunda opção, o mochileiro leva suas próprias coisas, além da comida, que é um pouco menos que os 25 kg, e da barraca; porém, ainda conta com os carregadores para cozinhar, montar a barraca e transportar os utensílios de cozinha. Dessa forma, a diferença é que se carrega mais peso, mas ainda há o conforto de ter a comida feita e servida pelos guias.

Na terceira opção, a do “mochileiro pobre de marré deci”, você que carregue tudo o que quiser, compre sua própria comida, cozinhe, monte seu próprio acampamento e faça cocô no mato. Nessa “modalidade de miserável”, a criatura só tem o direito ao transporte 4X4, necessário até o ponto de partida para a trilha, e o guia, que também é obrigatório e indispensável na subida e descida. Na verdade, nem se entra na área do Monte Roraima sem um guia cadastrado.

A terceira opção nem foi cogitada pelo grupo, pois todos nós tínhamos o consenso de não querer cozinhar nos dias de trekking. Meu amigo, o francês e eu queríamos a opção de tudo incluído, pois não tínhamos experiência e não conseguiríamos carregar o necessário à alimentação de seis dias. O australiano, porém, queria pagar mais barato e escolher a segunda modalidade, carregando sua própria barraca e comida. Dessa forma, estávamos em um impasse: a opção do trekking de tudo incluído só poderia ser feita se tivéssemos um grupo de, no mínimo, cinco pessoas. Tínhamos apenas três (o francês, Michael e eu); o australiano até aceitaria pagar mais e migrar para o nosso grupo, se houvesse quatro pessoas e, assim, com ele, formássemos cinco e pudéssemos partir mais rapidamente para o tour. Ficamos, desse modo, de tentar arrumar mais uma pessoa para se juntar ao grupo do “tudo incluído” ou mesmo duas, para que ficássemos seis e o australiano pudesse nos acompanhar, na modalidade mais barata, carregando mais peso. De fato, ele era um homem alto e forte e, a primeira vista, capaz de fazer isso. O Chico foi embora e ficou de voltar mais tarde, a fim de saber se tínhamos conseguido mais alguém para fechar o grupo.

Meu amigo, o francês e eu partimos, então, aos hotéis da região a fim de tentar encontrar mochileiros perdidos, na mesma situação. O francês voltou sem resultados positivos. Nós ficamos um tempo na rua observando se passava alguém com cara de “gringo”. Alguns minutos depois, uma japonesinha com roupas muito estranhas passou por nós e se dirigiu a uma agência da rua. Sem nenhuma dúvida, corri atrás dela e a abordei antes que ela entrasse na Mystic. De fato, saia longa, calça legging e chinelos com meia denunciavam mais a sua “estrangeirice” do que os olhos puxadinhos. A conversa foi boa e pronto, já tínhamos a agradável Shoko do nosso lado e fechando nosso grupo de cinco pessoas para o trekking. A ideia era partir logo na manhã seguinte, dia 18 de maio.

Entretanto, nesse intervalo de tempo em busca do “quinto elemento”, soubemos por um telefonema do Chico ao hotel, que seríamos forçados a esperar, de qualquer maneira, o início do tour. A estrada principal de acesso ao Monte Roraima estava bloqueada por aqueles mineiros em protesto contra o governo. Chico não tinha a menor ideia de quando a via seria liberada e, assim, só pediu paciência. A coisa toda, segundo ele, poderia durar até uma semana! Isso deixou a todos nós super frustrados. Afinal, amargar tanto tempo na monótona Santa Elena de Uairén não seria nada fácil! Dia 18, então, foi de espera. Choveu; nós andamos pela cidade (não há muito que se fazer na cidade… Sugiro uma visita à praça principal e à Catedral), ficamos no hotel e aproveitamos pra conversar com a família pela Internet. Chico nos atualizava pelo telefone e as notícias não eram boas. O francês, Jean Pierre, ameaçou desistir, pois não queria esperar tanto tempo. Voltaríamos aí à estaca zero, sem conseguir formar um grupo fechado de cinco pessoas. Eu estranhava a falta de viajantes dispostos ao trekking do Monte Roraima; havia muitos mochileiros pela cidade, mas os passeios do parque Nacional da Canaima eram os mais escolhidos. Eu até descobri o motivo depois…

catedral de Santa Elena de Uairén, Venezuela

catedral de Santa Elena de Uairén, Venezuela

Dia 19 chegou e, enquanto esperávamos pelo Chico, fomos às outras agências da rua verificar se elas estavam nas mesmas condições de espera e se havia mais interessados em formar novos grupos, caso Jean Pierre desistisse mesmo. Encontramos um representante da Kamadac, que ficava praticamente em frente ao Michele, recepcionando um grupo de loiros altos que acabara de retornar do Monte Roraima. Fomos, então, perguntar como eles tinham conseguido passar pelo bloqueio da estrada e descobrimos um fato muito interessante. Essa agência possuía mais de uma van. Dessa maneira, uma voltara do passeio com os mochileiros e estacionara antes do bloqueio e outra já estava à espera deles depois da manifestação, para voltar à cidade. No espaço fechado pelos mineiros, os viajantes passaram a pé, com a permissão deles. Assim seria feito, no dia seguinte, para o grupo que iniciaria a próxima aventura. Como o Chico já estava há três dias nos comunicando as novidades e já havia perdido tempo conosco, tentamos manter a ética e nos dirigimos em primeiro lugar a ele para sugerir a estratégia da Kamadac. Infelizmente, Chico não poderia fazer a mesma coisa e nós imaginamos que ele só tinha um carro e como o mundo dos negócios é uma selva, hesitamos pouco em fechar com a nova agência, partindo o coração do pobre Chico, que se sentindo mais traído que um corno manso, me fulminou com um olhar gélido e saiu mudo e calado depois que eu lhe dei a boa nova, no hotel.

Enfim, o preço da Kamadac era até mais barato, mas também recomendo aqui nesse relato os serviços do Chico, pois fiquei com pena dele e ele foi muito gentil, com exceção daquele olhar… Seguem os valores – em Bolívares Fuertes:

3.200 – tudo incluído (há três carregadores num grupo de cinco pessoas), mochileiro só leva itens pessoais e colchão – isolante térmico; carregadores levam comida, barracas, cozinham e montam acampamentos;

2.750 – mochileiro carrega, além de seus próprios pertences, a sua comida e a sua barraca. Porém, ainda conta com os serviços dos guias para cozinhar e montar acampamentos;

A opção mais barata nós nem perguntamos o preço (opção que o mochileiro leva tudo e deve comprar e fazer a própria comida. Só conta com transporte e orientação na montanha).

400 – por dia, se alguém necessitasse de um carregador por conta.

Dia 19 à noite, nos reunimos na agência Kamadac para discutir o trekking. Foram dadas explicações sobre a trilha, sobre a comida e tratamos do pagamento antecipadamente. Dentre as instruções de segurança oferecidas, uma curiosíssima se destacou: ao chegar ao topo, nada de gritos entusiasmados; o monte é sagrado, pede silêncio e reverência e, além disso, acredita-se que gritos, supostamente, atraiam mais chuva. Na agência, também poderíamos deixar, pelos seis dias, o excesso da nossa bagagem, roupas a mais, laptops, etc. De fato, achei ser mais seguro que o Michele, que também oferecia o mesmo serviço; porém, o guarda volumes do hotel não era trancado e tinha acesso livre de qualquer hóspede. Fizemos check-out e deixamos o excesso das mochilas na Kamadac. Estava realmente tudo em ordem na volta.

(KAMADAC – Hairim Garcia hairim@kamadac.de/ Calle Urdaneta, Casco Central Santa Elena de Uairen, Estado Bolivar/ 58 (0) 289-9951408/ (0) 414-8866526/ www.kamadac.de / info@kamadac.de / Matthias Lewy matthias@kamadac.de).

Primeiro dia:

Em 20 de maio, então, iniciamos nosso primeiro dia do passeio ao Monte Roraima. O grupo foi maior e enchemos duas vans. Saímos por volta de 9h30min da manhã de Santa Elena, paramos antes da barreira do protesto e caminhamos até atravessar o bloqueio, com autorização dos mineiros. Por uns 40 minutos, esperamos que as mochilas fossem novamente colocadas nas outras vans e finalmente partimos. As rodovias da Venezuela são surpreendentemente boas e o asfalto é macio até que se chega a uma estrada de terra, na qual vemos, certamente, a necessidade dos carros 4X4. Anda-se mais uma hora, mais ou menos, na estrada de terra. Eu estava na frente, com o guia, e soube que era simplesmente a 78º vez que ele fazia esse trekking. Experiência ele tinha!

Chegamos à comunidade indígena de Paraitepuy por volta de 12h30min; essa é a linha inicial da trilha e uma das entradas do Parque Nacional da Canaima. O Monte ainda não é tão bem visível desse ponto. Da estrada, a visão dele é até melhor. Nessa primeira parada, comemos um sanduíche de pão com queijo e tomate e demos uma última arrumada na mochila. Havia grupos de outras agências também, mas o nosso contou com umas 12 pessoas. Alguns reclamaram que somente um sanduíche de pão de forma não seria suficiente para horas de caminhada e insistiram em mais um lanche. Pra mim, que tinha a impressão de ter caído ali de paraquedas, tanto fazia a quantidade de comida; eu não sabia bem o que esperar. Estava mais orgulhosa do meu material de camping, inédito na minha vida, meu colchão limpinho, meu bastão que ansiava por começar a caminhar, meu saco de dormir perfeitamente encasulado na sua capinha e minhas botas pretinhas de novas (tudo comprado na Decathlon, em São Paulo, por um bom preço). O australiano lamentou sorrindo o quanto aqueles itens, ainda embalados originalmente, estariam destruídos no final de seis dias. Aquele comentário me soou como vindo de uma pessoa desleixada. Eu não estragaria minhas valiosas compras. Claro que meu material se manteria limpo e digno da sua dona, a criatura organizada que eu sou! É… Eu não sabia de absolutamente nada… (e o australiano, que já tinha rodado meio mundo, sabia bem…).

comunidade indígena de Paraitepuy

comunidade indígena de Paraitepuy

Paraitepuy

Paraitepuy

Subir o Monte Roraima, pra mim, era um mistério que pela exata falta de informação não se configurava como uma ameaça naquele momento. Aqui, é aceitável que todos possam me questionar sobre como eu não tinha informação… Acaso, eu não havia pesquisado sobre esse trekking? Bem, somente a situação emocional na qual eu me encontrava no início do ano poderia começar a explicar como eu me lançaria de modo tão displicente a subir o que simplesmente é o terceiro ponto mais alto do Brasil. De fato, eu planejara a viagem, mas esse planejamento, por mais considerável que pudesse ser, só consistia em ter juntado o dinheiro necessário e ter, finalmente, aceitado que talvez eu não fosse realmente insubstituível na empresa da família. Então, de modo surpreendente pra mim, em muitos anos, eu tinha o tempo e os recursos. Mais do que isso, eu tinha vontade; uma ânsia desmedida de fugir de mim mesma, da tristeza, da ansiedade extrema, da perplexidade e do tormento dos pensamentos recorrentes, que só têm aqueles que entendem o que é uma rejeição amorosa.

Eu sempre quis passar meses viajando; sempre foi um sonho e tinha inveja das histórias daqueles que conseguiam. Porém, naquela ocasião, viajar, pra onde quer que fosse e o mais rápido possível, era o que eu mais desejava. Como mencionei no início do relato, eu pretendia me jogar no mundo, mas não sabia como. Eu me enrolava na complicação de obter visto pra muitos países, roteiros complexos e falta de companhia. Tinha vontade de ir, mas nenhuma motivação de estudar como. Sentia a estagnação dos deprimidos, a falta de ânimo pra pensar. Assim, não hesitei muito quando Michael me convidou; gostei da ideia da América do Sul, achei coerente e sem burocracia, também cabia na minha vontade e na minha pressa, na fuga da cabeça vazia de pensamentos bons… Em um final de semana, ele veio até minha cidade, sentamos ao computador e ele apontou o roteiro no Google Maps. Impulsivamente, comprei a passagem de avião para Boa Vista naquele mesmo dia! Não pesquisei muito, confiei cegamente no itinerário do Michael e simplesmente o segui, como a um guia; e que guia! No final das contas, o roteiro conciso e finamente pesquisado se mostrou mesmo perfeito.

Foi assim que, às cegas, eu parti para o Monte Roraima, a primeira parada da nossa viagem. Nunca tinha ouvido falar nele e, depois de ver o nome no roteiro da planilha do Excel e me dignar a olhar umas fotos na Internet, resumi meus comentários a destacar a beleza do formato da montanha. Enxergar a relevância do fato de eu ser uma pessoa sedentária ou não ter a mínima experiência em trekkings, especialmente em escaladas, não aconteceu. Eu me sentia tão magoada e ressentida com a vida que não poderia conceber nada mais dando errado naquele momento e, dessa forma, eu equivocadamente, tomei o Monte Roraima como a distração que eu precisava ou apenas uma caminhada mais longa. Afinal, eu caminhava na vida; eu tinha duas pernas aparentemente boas e elas tinham a capacidade de andar. Era simples assim… Ademais, o que contribuiu com essa minha displicência foi ler alguns poucos relatos de viajantes, cujas afirmações de trilha “relativamente fácil” me deixaram mais confiante. Agora, eu digo, com muita propriedade, que “relativamente fácil” é algo dito de um montanhista – nem que seja amador – a outro ser da sua mesma espécie. Vai subir o Monte Roraima? Prepare-se! Não é fácil! As condições relativamente simples de escalada e acesso são somente “simples” para aqueles que possuem o mínimo de condicionamento físico! Não é necessário ser um atleta, realmente; porém, se você é um “couch potato”, como eu era, prefira abster-se desse sofrimento. Como descreverei a seguir, eu, inacreditavelmente, consegui vencer o trekking, mas quase a custo da minha vida, sem exageros. O Michael chegou a me perguntar se eu estava me preparando fisicamente e eu, acreditando na ingenuidade da frase feita, dizia só que “tudo daria certo”. Naquela reunião na Kamadac, de fato, o guia comentara que subir o Monte era “tough”, mas eu “fingi” não ter escutado…

Ainda no galpão da comunidade indígena de Paraitepuy, soube que o dia que mais andaríamos seriam 12 quilômetros. “Só isso?!” – exultei. Confesso também, agora lívida de vergonha, que assim que olhei Jean Pierre, o francês que nos acompanhou, comentei com o Michael, do alto da minha arrogância: “Se esse velho consegue, eu também consigo”. Jean Pierre tinha 64 anos e simplesmente me deu um banho!

Enfim, lanche na barriga e mochilas arrumadas, partimos. Eu, lépida e faceira, me posicionei atrás do guia e pude acompanhá-lo em toda a descida do início. Paraitepuy está a 1250 m acima do nível do mar e o primeiro acampamento, a 12 km dali, está até mais baixo, a 1140 metros. Esse primeiro dia de caminhada, então, é longo, mas é mais tranquilo. A maior parte do caminho é leve, um sobe e desce macio nas montanhas. A trilha de terra é limpa, bem delimitada, fácil de caminhar e o tempo estava ótimo. O céu azul com poucas nuvens nos acompanhou praticamente em todo o dia. Até aí, eu ainda estava atrás do guia. Um pouco de subida, descida, alguns córregos onde enchemos as garrafinhas de água, algumas pedras puladas, troncos no chão, e tudo certo. A mochila começou a pesar, mas nada que atrapalhasse; algumas pessoas já tinham me passado, reclamando suas posições na dianteira. Tudo certo! A vegetação é baixa, um verde tranquilo cobre as montanhas e alguns bosques isolados de floresta tropical pululam aqui e ali.

primeiro dia de trilha

primeiro dia de trilha

primeiro dia de trilha

primeiro dia de trilha

De repente, vem um morro e uma inclinação mais constante pra cima. Foi então que tudo começou! Todo mundo me passou e eu senti o rosto afoguear-se! Aquilo ainda não era nada… O restante do grupo permaneceu à frente e sumiu da minha vista nesse estágio. Eu subi o morro constante e calmamente, mas sentia que tinha só um pulmão funcionando! Estava ofegante e acalorada. A mochila começou a pesar o dobro, assim como minhas próprias pernas.

A seguir, renovada por mais um espaço de planície, entramos numa área de mata mais fechada e muitas árvores, mas isso é por pouco tempo. É possível tomar água no riacho cristalino e geladinho dentro do bosque. Em seguida, novamente a céu aberto, alguns pingos de chuva caíram, mas se dissiparam rapidamente. A maior parte do tempo, sol impiedoso e vegetação rasteira de savana. Assim, um conselho de amiga: óculos escuros e muito protetor solar, sem se esquecer do colo e orelhas! Quando eu voltei do Monte Roraima, tinha uma marca de bronzeado tão horrível no colo e nas costas, por causa da gola da camiseta, que parecia um desses pirulitos coloridos. Sugiro, portanto, até aqueles bonés que têm uma cobertura para o pescoço.

Umas duas horas, mais ou menos, depois de começar o trekking em Paraitepuy, alcança-se o Mirador do Monte Roraima, uma área de vista privilegiada para as montanhas. Nosso grupo já estava ali há muitos minutos e todos já se levantavam para continuar a caminhada quando eu e Michael chegamos. Assim, só tiramos algumas fotos e deixamos o descanso para depois. Havia muitas nuvens, ao redor das montanhas, obstruindo a visão, mas, mesmo assim, os contornos característicos do monte podiam ser lindamente apreciados.

Monte Roraima

Monte Roraima

O Monte Roraima não é uma montanha tradicional, de formato cônico, cujo topo é muito menor do que a área da base. Ele é um tepui, assim como o outro monte ao lado. Um tepui, formação muito comum na Venezuela, é uma montanha com a parte de cima em formato de mesa, um platô. Portanto, esse tipo de formação montanhosa possui a área do topo praticamente igual à da base e, entre os dois, no caso do Monte Roraima, são quase 1000 m de altura que emergem da terra em formações semelhantes a falésias. É realmente muito bonito! O verde alcança até o paredão do monte que, em seguida, sobe imponente, na rudeza da pedra, em direção ao céu, reto e igualmente por todos os lados.

vista aérea (foto da Internet)

vista aérea (foto da Internet)

vista aérea do Monte Roraima (foto da Internet)

vista aérea do Monte Roraima (foto da Internet)

Monte Roraima visto da trilha

Monte Roraima visto da trilha

Monte Roraima visto da trilha

Monte Roraima visto da trilha

Ao final de cerca de 5 horas de caminhada, chegamos ao primeiro camping. O restante do grupo já estava lá há uma hora e meia, mas isso não diminuiu a satisfação que eu tive com o meu tempo. Nessa área, há um galpão rústico de taipa com uma mesa grande para refeições e espaço onde os guias e carregadores acomodam a cozinha móvel. Uma placa indica que a região é protegida pelo Parque Nacional Canaima, do lado Venezuelano. O rio Ték está a poucos metros do local onde são montadas as barracas e, assim, é possível encher garrafinhas, escovar os dentes e ter um último nível de contato com a civilidade. Assim que chegamos, eu fiz milagres pra sair da minha roupa e entrar num maiô sem que tivesse que ficar pelada, já que privacidade é algo inexistente, ao menos enquanto as barracas estão desfeitas, e entrei para um banho no rio. A água super gelada e o leito do rio pedregulhento são desconfortáveis, mas o banho foi revigorante, ainda que meio “Big Brother”. Lavei o cabelo, deixei a água acalmar a dor nas pernas e massageei os pés nas rochas. Perto do acampamento, há uma área mais profunda do rio e dá até pra nadar um pouquinho. Aqui, mais um conselho, algo que me fez muita falta: um par de chinelos de dedo. Eu pensei que iríamos sempre caminhar com as botas e só tirá-las para entrar nas barracas e julguei que carregar chinelos seria um peso a mais. Ledo engano! Há muito tempo nos acampamentos que pedem sossego e liberdade para os pés. Para ir ao rio, eu sofri pisando descalça nas pedrinhas do chão e, mais tarde, tinha obrigatoriamente que me manter nas botas pesadas para jantar ou ir ao banheiro. Ao fim de seis dias, tirar e colocar as botas era tão torturante quanto a programação de domingo na TV aberta e palavrões acompanhavam a tarefa como se fossem inerentes a ela.

Quando voltamos do rio, o cheiro do jantar estava no ar. Comemos macarrão a bolonhesa e tomamos suco. Tudo era muito simples e despojado de qualquer conforto, mas a comida, em ótima quantidade, era até muito bem feita, considerando ter que trabalhar à meia luz, com fogareiros, lampiões e depois de um dia todo de andança. Na verdade, eu nunca consegui terminar um prato. Diferentemente de mim, havia dois alemães no grupo, um casal, que até repetia. Eu mal podia acreditar que eles conseguissem comer mais do que aquele prato inicial de pedreiro! Mas eram altos, magros e tinham um condicionamento físico invejável. Assim, a enorme quantidade de calorias ingerida queimava-se sem obstáculos. Se eu comesse aquilo tudo, certamente seria candidata a um reality sobre obesidade mórbida! Cada prato era, certamente, mais de um quilo de comida!

À noitinha, fui ao “banheiro”. Ele consistia basicamente de uma barraquinha pequena, porém alta, onde podíamos entrar em pé, através de uma porta com zíper. Dentro dela, um banquinho, cujo assento original fora substituído por um de plástico, para vasos sanitários. Em baixo dessa “estrutura”, um buraco na terra e acima, um gancho de arame com papel higiênico preso. Assim, fomos instruídos a sentar nesse banquinho, deixar a natureza agir e, em seguida, jogar terra em cima, inclusive do papel sujo, como lindos felinos domesticados. Eu sou portadora de uma doença que nomeei carinhosamente de “síndrome do cu inibido”; como o próprio nome diz, minhas funções fisiológicas sofrem consideravelmente diante de situação diferente da habitual. Em qualquer viagem, ele já fica “tímido”. Imaginem, então, que nessas condições, eu só fui fazer cocô quando estava quase literalmente explodindo. Enfim, importante dizer que esse era o tratamento “cinco estrelas” da modalidade “tudo incluído”. Nossa estrutura sanitária foi até objeto de inveja de um grupo de quatro cariocas que estava lá pela opção mais barata de tour; eles não tinham banheiro, macarrão quentinho em prato de plástico e nem mesa de refeições podre dentro de galpão de taipa. Realmente, ser “VIP” é bem relativo, mas melhor em qualquer circunstância…

Eu ainda estava bem dolorida e não dormi direito na barraca. Faltou travesseiro e sobrou dor. Porém, me sentia bem, ativa e distraída com novas e diferentes atividades. O grupo era simpático e as conversas muito agradáveis.

As barracas da Kamadac eram boas e acomodavam duas pessoas. Pares foram formados, ainda que por pessoas desconhecidas, algo, de certa forma, constrangedor, já que, dentro daquele cubículo, há que se dividir desde chulé até tentativas de diálogos menos superficiais. Eu e Michael, apesar de recentes colegas, partilhávamos do sentimento cúmplice de ter feito a mesma escolha. Assim, ao menos eu não me senti envergonhada.

Segundo dia:

Acordamos cedo, fizemos fila no banheiro, nos aprontamos e enquanto tomávamos café (ovos e empanadas, um tipo típico de pastelzinho redondo, pesado e gordurento), os carregadores levantavam acampamento. Depois que eles lavaram todos os utensílios no rio, começamos a caminhada do segundo dia. Seriam 9 km e eu fiquei mais entusiasmada com a diminuição da distância, equivoco que logo se instauraria em mim como a íntima sensação de esgotamento do dia anterior.

Logo que saímos do acampamento, por volta das 8 da manhã, tivemos que atravessar o rio Ték. São somente alguns metros e a sua profundidade, na maior parte, é bem rasa. Entretanto, o peso da mochila e as pedras do leito são inegáveis fatores de desequilíbrio e ficar com roupas molhadas no Monte Roraima não é nada agradável. Os guias logo nos adestraram a tirar as botas e atravessar de meias. “De meias?” – questionei. A teoria é que o atrito gerado pelo tecido em contato com a superfície da pedra funciona melhor contra potenciais escorregadas do que a própria sola de borracha das botas ou os pés descalços. A princípio, eu duvidei seriamente que meias na água pudessem ser menos escorregadias do que qualquer tipo de sapato, pela simples falta de complexidade de algo tão reles como uma meia. Mais uma vez, a arrogância se fez presente em mim que torci o nariz logo de cara, sem estar amparada por qualquer lei da Física e criticando uma orientação de alguém que estava fazendo a mesma coisa pela septuagésima oitava vez. Mas isso durou pouco; voltei rapidamente a vestir minha habitual humildade e segui as regras, confiando na experiência e na explicação do guia. Na verdade, eu já tinha escutado sobre atravessar o rio de meias, lá dias atrás através do velho Chico, mas confesso que a informação entrou por um ouvido e saiu pelo outro; cheguei até a levar sacolinhas plásticas e fita adesiva, na intenção de levantar as calças, forrar as botas e vedar a entrada de água, na travessia. Pensava que, dessa maneira, protegeria meus pés das pedras, sem molhar as botas. Entretanto, receei que alguma cena vexatória pudesse derivar da minha amadora estratégia, enquanto todos os outros seguiam as instruções oficiais, e resolvi confiar. Eles deveriam saber o que estavam fazendo, afinal! Qual foi minha surpresa quando percebi a enorme eficácia das meias sobre lisura das rochas! Realmente, elas grudam de um modo que dá muito mais segurança; elas aderem firmemente e impedem os deslizes. Fiquei pasmada! As meias molhadas podem ser colocadas sobre a mochila para irem secando no caminho e pares de meias extras são, portanto, muito necessários.

rio Ték

rio Ték

Rio atravessado, continuamos a empreitada, em direção ao segundo acampamento. Os 9 km desse dia são, com poucas exceções, de subida. Há alguns momentos onde elas são bastante íngremes e cansam bem, mas, de modo geral, o caminho do segundo dia é de uma subida menos acentuada, porém constante e extremamente exigente.

Depois que se atravessa o rio Ték, logo no início da manhã, a trilha ainda é limpa e quase nivelada. Cerca de uma hora depois, há que se cruzar outro rio; o Kukenán. Para se chegar a ele, há alguns metros de descida quase na vertical e os bastões de caminhada mostram-se muito úteis.

chegando ao rio Kukenán

chegando ao rio Kukenán

Esse rio é bem maior, mais largo e mais fundo que o primeiro. A correnteza é traiçoeira, a água chega forte aos joelhos e, assim, a ajuda dos guias na travessia é fundamental. Mais uma vez, retiramos as botas e, de meias, segurando nas mãos do guia, passamos para o outro lado. Ele, que parece conhecer de cor cada pedregulho no leito do rio, vai indicando, com seu próprio bastão, sobre qual pedra devemos posicionar os pés e parece ser muito fácil perder o equilíbrio, por causa do peso da mochila. Mas os guias mostram-se confiantes e bem competentes nesse sentido e todos atravessamos sem problemas.

rio Kukenán

rio Kukenán

Segundo rio vencido e continuamos. A partir daí, a trilha começa a subir constantemente, sem mais momentos de caminho nivelado e começa-se a sofrer também com as pedras no chão; o caminho de terra ainda é delimitado e visível, mas não é mais limpo, como até então; as pedras grandes, médias, pequenas e muito abundantes exigem um constante reposicionamento do eixo do corpo e os pés, a cada segundo tortos, também cooperam para o cansaço geral. Reitero que o grupo todo estava, sem evidência física de esgotamento, bem à frente de mim. O “velho” de 64 anos, o australiano recém – operado do joelho, os alemães bons de garfo e até a Shoko, de aparência delicada e ainda vestida em camadas. Depois de muito pouco tempo, eu já nem via mais o resto do grupo, que desaparecera adiante. Todos eles exibiam muito mais força e condicionamento do que eu. Tinha até um japonesinho de outra agência subindo de calça jeans e levando seu equipamento em sacos de lixo pretos, já que ele não tinha mochila. Por estar com as mãos ocupadas, o pobre escorregou em uma ocasião e cortou o queixo; mesmo assim, em jeans e limitado nos movimentos, subiu o monte muito melhor do que eu; afinal, era melhor ter pulmões e pernas funcionando a todo vapor do que um material completo novinho em folha. Então, digo mais uma vez que não é necessário ser profissional pra encarar o Monte Roraima, mas precisa-se sim de experiência em trekkings e estar com o físico em dia. Soube mais tarde que a aparentemente frágil japonesinha Shoko já tinha até chegado ao acampamento base do Everest. Então…

De qualquer modo, 9 Km de quase que inteiramente subida constante, ainda que não tão acentuada, não é nada fácil e é cansativo pra qualquer um!

Continuei no meu ritmo e persisti num passo irritantemente atrasado. Minha respiração arquejava e o ângulo de ascensão imutável do caminho cobrava alto o preço da minha falta de condicionamento. Cada vez que eu olhava um cume de morro, desejava que houvesse um escorregador depois dele ou possivelmente o teleférico imaginário que me levaria até o topo do Monte Roraima. Porém, como a vida não é justa, cada fim de morrinho revelava outro um pouco mais alto em seguida.

No dia anterior, Jason, o australiano, tentara me incentivar com a sua própria estratégia de sucesso. Eu deveria, teoricamente, subir devagar e sempre; esse era o segredo. Não parar de modo excessivo. Eu pensava nesse conselho de 5 em 5 minutos, quando, ao não conseguir segui-lo, empacava, esgotada, tentando puxar ar daquele meu único pulmão ativo. Mesmo devagar, eu não conseguia manter um ritmo constante. Parava demais e respirava profundamente.

Como a trilha é delimitada e, portanto, o caminho não exige a presença constante do guia para indicá-lo, não há a necessidade do grupo se manter unido. Todos acabaram, dentro de seus próprios ritmos, seguindo sozinhos ou em pares. Por um lado, a situação me deixava muito confortável, pois não há nada que eu mais deteste nesse mundo do que a sensação de estar atrapalhando alguém. Ouvi dizer que a trilha para Macchu Picchu deve ser feita, como os guias costumam dizer, como uma família unida; todos têm que ficar juntos. Dessa forma, os mais rápidos provavelmente lançam amargas pragas aos retardatários e esses, por sua vez, ao invés de só aproveitarem o caminho, devem reviver os tempos de escola e toda a rejeição nas aulas de educação física. Isso gera um sentimento muito ruim. Assim, eu gostava muito da solidão do caminho e de pensar que o grupo não estava desgostosamente atrasado no meu passo. Por outro lado, a mesma sensação de solidão me rendia momentos melancólicos de introspecção. Eu não sabia bem se me sentia triste por estar só ou intimamente confortada pelo privilégio de presenciar todos aqueles tons de natureza intocada. Dava pra ouvir o silêncio e os olhos, cada vez que se viravam para o vale, não encontravam obstáculos entre o céu e as montanhas; o horizonte era infinito. Para cima, só os morros e as pessoas à minha frente, tão minusculamente distantes que me dava medo do que eu ainda teria que andar.

Nesse ponto da trilha, até o Michael, que também não estava lá na sua melhor forma, se adiantou de mim. Só nos reencontramos para que ele pudesse convenientemente presenciar a afundada até o joelho que eu dei na lama. Molhei toda a bota e a calça e perdi mais alguns minutos tentando tirar o excesso de barro com a ajuda de pedras. Há que se prestar muita atenção nessa parte do caminho; muito mato baixo camufla a presença de buracos com barro e lama acumulados das chuvas, onde frequentemente trekkers torcem o pé ou, na melhor das hipóteses, como na minha, só se sujam bastante. A ajuda de um bastão de caminhada, a fim de identificar essas armadilhas, é bem válida. Eu estava com um, mas mesmo assim, não escapei do infortúnio.

Gran Sabana

Gran Sabana

Monte Roraima (reprodução de foto da Internet)

Monte Roraima (reprodução de foto da Internet)

Cinco horas e meia depois do início do dia, novamente com cerca de uma hora e meia de defasagem, eu chegava ao segundo acampamento, bem aos pés do Monte Roraima. Michael estava comigo e passava da 1h30min da tarde. O resto do grupo já havia almoçado e meu estômago se revirava de fome. Comemos sanduíche de atum e salada, esperamos as barracas serem armadas e descansamos. Os almoços eram sempre mais leves, geralmente, sanduíches e saladas frias. O motivo, que me deixou convencida, era para que a energia dispensada na digestão fosse menor e não atrapalhasse a caminhada durante o dia. Às noites, as jantas eram quentes e bem mais substanciosas. Durante a tarde, eu lavei minha calça e botas na cachoeira perto do acampamento, deitei ao lado da barraca e escrevi. O francês lia, o australiano tirava fotos e todos procuravam distrair-se e aproveitar o momento. Nesse dia, o zíper da nossa barraquinha sanitária quebrou e foi particularmente difícil tentar segurar a lona da porta, se acocorar sobre o assento e pegar o papel, tudo ao mesmo tempo; desejei ser um polvo ou uma deusa hindu, cheia de braços. O Michael pediu que eu segurasse a porta pra ele, mas logo, constrangido por motivos óbvios, implorou que eu me afastasse. Assim, a estratégia geral foi montar guarda na frente da casinha, indicando que a mesma estava em uso.

À noite, sob um rústico abrigo de lona azul, comemos arroz e frango com curry. Estava uma delícia, mas o meu cansaço paradoxalmente me deixava sem fome e eu não consegui comer quase nada. Devolvi o prato cheio ao guia, elogiando a comida, mas evidenciando a quantidade exagerada. “It´s too much!” – afirmei, ao que se seguiu um olhar arregalado do rapaz e a revelação que eu fora a primeira pessoa, em toda a sua trajetória, a dizer isso. Nesse dia, não tive coragem de tomar banho de rio; a água parecia sair direto do freezer. Dormi suja e cansada. Aconselho levar lenços umedecidos. E novamente, os chinelos me fizeram muita falta; para caminhar do acampamento à cachoeira, à casinha sanitária ou ao galpão de refeições.

guias

guias

O Monte Roraima está bem atrás do segundo acampamento (que está a cerca de 1870 metros acima do nível do mar). A partir daí, a vegetação que era predominantemente rasteira já dá lugar a uma densa floresta equatorial, que se arrasta aos pés do monte e o rodeia inteiramente. Em seguida, seu paredão de pedra vertical começa a emergir da terra. A paisagem é linda e o céu azul e limpo, naquele dia, deixava os contornos do topo mais nítidos e intimidadores. “Como eu vou chegar lá em cima?” – me perguntava. Eu não via nenhuma trilha, mas sabia que não escalaríamos o paredão na vertical. Pra isso, eu tinha certeza que treinamento adequado e equipamento seriam necessários e imprescindíveis. No fim da tarde, algumas nuvens cercaram a montanha, deixando-a um pouco escondida e com aspecto misterioso. Imaginei que, estando lá no meio da névoa, não deveríamos enxergar a um palmo diante dos olhos; e era verdade!

segundo acampamento - base camp

segundo acampamento – base camp

paredão

paredão

nuvens cercando os tepuis

nuvens cercando os tepuis

Terceiro dia:

Acordamos cedo, por volta das 7h, no dia 22 de maio; comemos empanadas com mortadela e logo partimos para vencer o maior desafio do terceiro dia de trekking: chegar ao topo! A previsão ideal era que o grupo atingisse o destino final por volta do meio dia, ou seja, cerca de quatro horas de caminhada: duas na mata e duas na trilha do paredão. É importante, segundo os guias, que se chegue ao topo o mais cedo possível, a fim de se evitar o mal tempo, a chuva e o frio, além de poder montar acampamento com mais tranquilidade.

Na hora do café, recebemos um saquinho de plástico com o almoço, um sanduíche de pão com ovo para que, dessa forma, cada um a seu ritmo, comesse o lanche quando sentisse vontade; durante a subida ou depois que chegasse ao final do trekking.

Minhas roupas, apesar de terem ficado secando a noite anterior inteira, sobre as pedras, ainda estavam úmidas. O nível de umidade do ar nessa região é altíssimo assim como o pluviométrico. Considero que fomos extremamente afortunados por termos feito praticamente todo o passeio com tempo bom e céu azul. Então, sugiro o mês de maio como uma ótima época para se aventurar no Monte Roraima. Apesar de haver muita umidade, quase não choveu e o clima estava bem confortável. Na maioria dos relatos que o Michael havia lido sobre esse trekking, não faltaram chorosas narrativas de muita lama, barracas e roupas molhadas, frieiras sangrentas nos pés, reclamação, desconforto, chuva ininterrupta em dias e muito frio. Assim, ao menos nesse aspecto, tivemos muita sorte e o tempo estava a nosso favor. De fato, Roraima significa “A Mãe de Todas as Águas” e, assim, escapar do trekking quase sem chuva foi realmente raro e animador! Sem contar que se o céu estiver frequentemente cinza, perde-se muito da bela vista e é pra isso que estamos lá, afinal!

Saímos do acampamento, passamos a pequena cachoeira, onde abastecemos as garrafinhas, e nos embrenhamos na mata. As árvores já ficam mais altas, o clima fresco e o caminho menos delimitado, apesar de ainda visível. Colocamos blusa e calças de chuva para proteção e capas nas mochilas. Eu improvisei com um saco de lixo, pois não tinha conseguido comprar uma capa de mochila apropriada. Como não choveu muito, não senti falta, mas aconselho a ter esse equipamento.

Agora sim, a provação se iniciaria. Foram os quatro quilômetros mais difíceis, penosos e vexatórios da minha vida. Foi então que me familiarizei com a palavra “escalaminhada” e temi pela minha própria existência!

O acampamento base (segundo acampamento) está a 1874 m acima do nível do mar. O topo do Monte Roraima, onde o terceiro acampamento é montado, está a 2700 m, ou seja, cerca de 800 m de paredão. No topo, numa determinada área, ainda é possível subir mais uns 100 metros, que se somam ao monte para deixá-lo mais alto e imponente. Entretanto, os acampamentos são sempre armados aos 2700 m.

Nesse dia então, como mencionei, são por volta de 4 km de caminhada pela trilha. Parece pouco, não? Sim, mas que tal experimentar essa distância em caminhos íngremes, cheios de pedras deslizantes e barro escorregadio?! As pedras eram tão grandes que o único indício que nos levava a crer que a trilha fosse aquela que seguíamos era não haver árvores em cima. Logo que passamos a cachoeira e andamos um pouco, já nos deparamos com o primeiro forte obstáculo; um percurso embarreado no qual tínhamos que apoiar as mãos pra poder continuar. Ali, Michael me apresentou ao novo vocábulo, que me serviria para o resto do dia: “escalaminhada” ou, conforme definição que encontrei na Internet: “Caminhada em trilhas de ascensão, onde nos lugares mais difíceis de subir, usam-se as mãos em raízes ou pedras que existem no caminho; sem a necessidade do uso de cordas ou semelhantes”. Assim, podemos dizer que a trilha não era tão íngreme a ponto de exigir cordas, polias, mosquetões ou esses materiais de uso em escaladas verticais e montanhismo, mas era íngreme o bastante para quase me fazer desistir. Por poucos segundos, eu pensei que jamais conseguiria subir aquele pedaço. A mochila fazia peso e me limitava os movimentos; o bastão de caminhada chegava a atrapalhar, pois as mãos deveriam estar livres. Uma pedra grande pendia pra frente e dificultava ainda mais a luta contra a força da gravidade. Eu simplesmente não conseguia encontrar posição para ultrapassá-la e subir. O Michael conseguiu vencer poucos metros, mas não tinha forças o suficiente para me puxar e acabamos ficando nesse impasse por uns 5 minutos, até que um casal de franceses chegasse e me ajudasse. O rapaz, alheio à nossa perfeita contração de “escalada” e “caminhada”, podia não conhecer o neologismo da Língua, mas sabia agir na situação. Rapidamente, ele me empurrou pela mochila enquanto a moça e o Michael me seguraram em cima. Passei o primeiro obstáculo e, ingenuamente, achei que fora o pior do dia. Um dos guias passou por mim e me tranquilizou, afirmando que o mais difícil tinha passado, mas eles devem ser treinados pra isso, pois não era bem assim.

escalaminhando!

escalaminhando!

escalaminhando

escalaminhando

A manhã estava nublada e tudo ficava mais molhado; apesar de não termos que enfrentar a chuva, a água ainda parecia brotar do chão, encharcando nosso caminho e pintando a mata de um verde intenso e orvalhado. Eu ia me agarrando às raízes para não escorregar e, a passos medrosos, tentava seguir adiante. Michael também não se sentia com muita confiança e parecia igualmente ofegante.

escalaminhando no Monte Roraima

escalaminhando no Monte Roraima

Ao invés de duas horas, levamos quatro apenas para chegar à base do paredão. O resto do grupo seguia adiante e todos que passavam por nós, desapareciam em poucos segundos, à frente. O nosso guia principal subia, mas sempre voltava para checar se ainda estávamos vivos.

Em praticamente todo o percurso até o paredão, a mata nos cobre com poucos períodos nos quais ficamos expostos ao sol; mas protetor ainda não deve ser esquecido! Durante esse tempo, apesar do cansaço, ainda dava pra admirar a floresta que nos acolhia, com suas raízes emaranhadas, pedras gigantescas e bromélias exóticas.

Ao chegar à parede do monte, toquei a pedra fria e senti uma sensação de desassossego, de estar apenas na metade do caminho. Olhei pra cima e era muito alto! Tão alto que eu não concebia a ideia de estar lá apenas no final do dia. Continuei… De algum modo, eu sabia que chegaria lá, que eventualmente, estaria no topo do Monte Roraima! Eu teria que conseguir, já que a minha própria personalidade, avessa a chamar qualquer tipo de atenção, se negaria a voltar, a ter que dispensar um guia apenas pra me acompanhar pra baixo, com atenção especial e, possivelmente, custo extra. Continuei com determinação!

chegamos ao paredão!

chegamos ao paredão!

Depois da floresta, a trilha segue estreita e escarpada, contornando o paredão e, à medida que subíamos, o abismo se fazia mais e mais assustador. Do lado direito, a parede lisa e limosa do monte e do esquerdo, o despenhadeiro, na visão infinita do parque da Gran Sabana. Parece exagero, mas qualquer passo em falso ou uma pedra solta poderiam ser responsáveis por uma queda fatal! O que, de fato, quase aconteceu ao nosso guia. Em determinado momento, ao ajudar o Michael a ultrapassar uma dificuldade, o experiente guia simplesmente escorregou no barro do chão e, na frente dos nossos olhos perplexos e sem ação, só se salvou por causa de uma árvore no caminho. Tudo aconteceu tão rápido que ele cairia antes mesmo que um de nós esboçasse qualquer reação! Eu só o vi caindo e se agarrando aos galhos da árvore, ficando alguns segundos pendendo no ar! Foi surreal! Por um momento, me imaginei contando as boas novas ao resto do grupo… “Pois é, sabe o nosso guia? Ele acabou de morrer”. Agora, eu brinco, mas na hora, foi simplesmente inacreditável. Ele saiu rindo e nós comentamos que se até ele estava passível de acidentes trágicos, imagine nós. No final das contas, também fizemos piada, já que a gente nunca pensa que qualquer tragédia acontecerá bem conosco! Como diz meu pai “só morremos se for a nossa hora, ou a hora do piloto”. Michael comentou que nem um século de terapia o livraria da culpa, caso aquela árvore não estivesse no caminho… Dizem que subir o Monte Roraima por essa trilha do lado venezuelano não é uma escalada de risco e que qualquer um pode fazê-la. Eu não diria que não há riscos, há sim! Está certo que eu consegui vencê-la sem nenhuma experiência. Porém, como já escrevi, creio que tive mais sorte do que juízo. Experiência vale demais e cobra um preço menor no nosso corpo…

Num dado momento, alcançamos o Mirador, área onde pudemos apreciar uma bela vista do vale e do monte. Logo depois do Mirador, eu cheguei à inevitável conclusão de que não conseguiria mais carregar minha mochila. Eu tinha aguentado o quanto podia; ela me atrasava, me dava uma aguda dor nas costas e deixava minhas pernas mais pesadas. Eu estava convencida de que tudo teria sido mais fácil e menos penoso se eu tivesse, desde o início, feito o trajeto mais leve. Realmente, além do sedentarismo, eu tenho pés chatos o que comprovadamente dificultam qualquer caminhada. Subir com peso nas costas, nesse caso, se mostrava ainda mais desafiador! Eu não queria gastar mais dinheiro, porém simplesmente entendi que eu jamais chegaria ao topo carregando a mochila. Parei e esperei um dos guias passar por nós; quando Simon, um dos indígenas, nos encontrou, perguntei se havia alguém para levar meu peso morro acima. Ele era um rapaz franzino, e não hesitou em se oferecer. Pra minha surpresa, Simon posicionou na sua cesta, dentro da qual ele já carregava certa quantidade de comida, a minha mochila e mais a mochila do Michael, que chegara à mesma conclusão que eu, e não deu nem cinco minutos, pra que eu não visse mais o Simon na trilha. Ele já tinha subido, com o peso das duas mochilas e um pouco de comida! Fiquei estupefata!

Essa decisão foi a melhor que eu poderia ter tomado naquele momento, já que logo após o Mirador, há uma descida nojenta, que eu fiz praticamente sentada, arrastando a bunda morro abaixo. Se a mochila estivesse nas costas, não sei como teria feito para poder me sentar, pois somente assim tive equilíbrio pra continuar nessa parte, já que eu jogava o corpo pra trás, como estratégia para não cair. Era muito íngreme! Fui muito lentamente e me esgueirando entre as pedras de cor avermelhada e, nesse caso, como tudo que desce só acumula na subida rumo ao topo, a ascensão chegou ainda mais cansativa, num percurso apelidado de O Caminho das Lágrimas. Esse trecho ganhara o nome devido à cachoeira que incessantemente molha os trekkers e nunca seca, em nenhum período do ano. Eu o percorri inteiro de quatro; cerca de 30 metros de pedras avermelhadas lisas e soltas, tentando firmar as mãos e os pés. Nesse momento, eu realmente tive medo e não conseguia ficar em pé. Temia escorregar e me precipitar no abismo e não havia nada que pudesse servir de apoio firme. Como se não bastasse o aclive estreito, as pedras soltas, a encosta lisa de um lado e o vão mortal do outro, os grossos pingos de lágrima da queda d’água perene inundavam meus olhos, estorvando minha visão. Vamos lembrar novamente que essa é uma narrativa de uma inexperiente em escaladas já que o guia seguia de costas, em pé, na minha frente, me indicando onde pisar e em quais pedras tocar. Realmente, era meu vexame particular.

o Caminho das Lágrimas - pedras avermelhadas

o Caminho das Lágrimas – pedras avermelhadas

Passado o Caminho das Lágrimas, ainda levamos umas horas na trilha acidentada para, finalmente, por vota de quase quatro horas da tarde, pisar vigorosamente o topo do Monte Roraima. Vigor não é bem a palavra, mas, enfim, eu senti, por um milésimo de segundo, uma forte e verdadeira impressão de vitória! Mas como alegria de pobre dura pouco, fui informada pelo guia que nosso acampamento fora montado a ainda cerca de uma hora de caminhada dali. Imediatamente eu perguntei: “Uma hora sua ou uma hora minha?”; ele sorriu e me tranquilizou: “uns 20 minutos meus”. Ai eu pensei: “PQP! Ainda vou andar mais umas duas horas!”.

O guia era muito gentil e tentava me alegrar afirmando que havia muitas pessoas bem piores que eu e que só alcançavam aquele ponto aos prantos, passada 7 horas da noite, maldizendo a decisão de ter tomado a trilha e afins… Bom, não sei se me sentia melhor ou pior com aquele “consolo”.

Sem mais delongas, depois de apreciar meu milésimo de segundo de vitória e me intrigar com o solo acinzentado e rochoso do topo do monte, seguimos em direção do acampamento. O clima passara de quente para frio congelante em pouquíssimo tempo, questão de minutos, e o Michael, que tinha se esquecido de pegar um casaco na mochila e estava só de camiseta, se desculpou candidamente por não poder me esperar e sumiu, correndo na frente e temendo hipotermia. Eu continuei no passo que meus joelhos permitiam e o cansaço não me fez notar muito do que havia à minha volta, naquele momento; somente o solo, já que eu pisava nele e o sentia negro e acidentado. Tinha que pular poças e gretas profundas.

Chegamos ao acampamento passado das quatro da tarde. Já estava escuro pela densa neblina e o frio era cortante. O guia me acompanhava, mas todos os outros ajudantes já tinham montado as barracas e servido os meus companheiros de sopa quente. Eles já estavam lá há horas, desde meio dia, e não puderam fazer nada, já que o guia principal fora contratado como meu baby-sitter. Pedi sinceras desculpas a todos, por fazê-los perder uma tarde de explorações e fui confortada com exclamações de “Imagina!”, “Não se preocupe!”, “Não daria tempo de fazer nada mesmo…” Desconfiei que era por eu estar quase chorando e alguém com cara e olhos do gato do Shrek comove qualquer um. De certo, eles deveriam estar com ódio mortal de mim… Encontrei Michael entregue a um copo de chá e devidamente encasacado.

Peguei um prato de sopa e me sentei numa pedra. O acampamento ficava convenientemente abrigado em uma reentrância enorme nas rochas. Parecia que estávamos sob uma imensa marquise, dada a formação peculiar daquele pedaço de monte. As barracas tinham sido colocadas em fila indiana, contornando o paredão e se beneficiando do teto de pedra. Segundo o guia, aquele era um dos melhores spots pra camping, pois tínhamos chão seco e um “telhado” natural. Essas formações nas cavidades das rochas convenientes aos acampamentos são chamadas de “hotéis” e há várias assim no topo, aos 2700 metros. O guia dividiu conosco seu alívio por estar ali, trabalhando naquela época tranquila e compartilhou horríveis histórias de feriados superlotados, quando há tantos grupos de agências diferentes sobre o Roraima que o “trânsito” de pessoas fica infernal e não há lugares suficientes nos “hotéis” para montar acampamentos; assim, barracas são armadas ao ar livre e ficam à mercê dos ventos e temporais. Nesses casos, reclamações de abrigos voando ou roupas molhadas à noite são frequentes e estragam o passeio de qualquer um! Então, como tudo tem um lado positivo, também adorei estar ali naquela época especificamente!

esquema Monte Roraima (reprodução de imagem da Internet)

esquema Monte Roraima (reprodução de imagem da Internet)

Havia um laguinho a alguns metros do acampamento, onde podíamos tomar água e escovar os dentes. Estava muito frio para banhos, mas só lavar o rosto era um refrigério! Novamente os chinelos! Que raiva por não tê-los levado!

Nossa barraca estava ao lado da “cozinha”, parte de uma pedra que fazia uma mesinha onde apoiar o fogareiro e utensílios. O paredão de rocha contava com várias saliências de pedras, que formavam essas “mesas” e bem acima, uma protuberância maior, que servia de teto. Bem ao lado, jazia uma greta com fio de água e mais uma fileira de altas pedras. O único senão daquele lugar era que todos desviavam da greta e pisavam na nossa barraca para alcançar os pratos de comida. De resto, estava ótimo!

nosso acampamento sobre o topo

nosso acampamento sobre o topo

local do acampamento (reprodução de foto da Internet)

local do acampamento (reprodução de foto da Internet)

Jantamos macarrão com sardinha, dormimos cedo e guardamos energia para o dia seguinte, de exploração do topo do Monte Roraima!

Quarto dia:

Levantamos com o dia nublado e feio, e partimos cedo para a investigação de apenas parte dos 30 km2 que formam o topo do Tepui.

A primeira impressão que tive era de que a paisagem parecia o solo lunar, sem terra, mas formado apenas de pedras cor de carvão, que se confundiam com a névoa cinza da manhã. O solo de todo o platô é constituído de rochas enegrecidas e parece que todo o topo do monte, erigido da terra há milhões de anos, é somente uma enorme pedra e não lembra em nada a floresta exuberante ou a savana que se estendem aos seus pés. É realmente um lugar único que, sem surpresa, tenha inspirado o livro “O Mundo Perdido”, de 1912, do escritor Arthur Conan Doyle. Entretanto, apesar de me lembrar a lua, a paisagem não é morta; pelo contrário, das fissuras entre as rochas negras, brotam uma variedade enorme de pequenos arbustos musguentos, resistentes bromélias, flores exóticas e plantas carnívoras que se adaptaram ao alto índice pluviométrico e diferentes condições geológicas da região. Entre as pedras, também surgem muitas poças d’água que refreiam nossa passagem e evidenciam a irregularidade do terreno. A fauna também se mostra heroica, num desfilar de insetos e anfíbios, como um lindo mini-sapo preto que todos quisemos tocar.

topo do Monte Roraima

topo do Monte Roraima

no topo

no topo

el sapito

el sapito

Caminhamos bastante, entre inusitadas formações rochosas, como pedras em forma de pênis e torres de catedrais; subimos, descemos, passamos por cachoeiras, vales, grandes lagos, clareiras, paredões de pedra, desfiladeiros. As formações geológicas do Roraima datam de milhões de anos, incluindo-se entre as mais antigas do planeta e, de fato, elas são impressionantes.

topo do Monte

topo do Monte

topo do Monte

topo do Monte

lago no topo

lago no topo

No Vale dos Cristais, o chão é forrado de branco, devido aos cristais de quartzo presentes ali. O guia logo nos advertiu a não pegar nenhum como souvenir, pois ele poderia ser severamente punido caso fosse encontrado um cristal na inspeção das mochilas, na saída do parque. O casal de franceses imediatamente devolveu as pedrinhas ao chão.

cristais

cristais

Continuamos através de galerias e monumentos de pedra até chegar à beira do abismo, bem do lado do monte que nós víamos do segundo acampamento, o da base. Nesse momento, o grupo sentia-se um pouco frustrado por causa da forte neblina que impedia a visão do horizonte. Porém, já tínhamos experimentado, naquela mesma manhã, desde garoa e frio até sol escaldante e tempo claro. Assim, como o clima é algo que muda drástica e rapidamente no topo do Monte Roraima, permanecemos ali por alguns minutos, esperando que a névoa se dissipasse e o tempo mudasse novamente a nosso favor. Sem demora, o sol começou a apontar de novo e a Gran Sabana pode ser admirada abismo abaixo, através das nuvens, com todos os seus tons de verde e as ondulações das montanhas. À beira do precipício, eu sentia uma satisfação íntima por ter conseguido. Estar ali era lindo e tinha valido a pena!

no abismo

no abismo

grupo

grupo

na beira do abismo

na beira do abismo

no abismo

no abismo

La Ventana, uma formação rochosa incomum, na qual uma gigantesca pedra jaz sobre outras formando um tipo de janela para o abismo, me intrigava. Impossível entender como uma rocha daquele tamanho tinha ido parar ali!

no topo

no topo

Depois de tirar várias fotos do despenhadeiro, no que parecia ser o ápice da expedição, nos instalamos, em seguida, num lugar mais calmo para podermos almoçar. Enquanto os guias preparavam os sanduíches, uns poucos corajosos mergulharam em belíssimas piscinas naturais, formadas no meio das rochas. A água cristalina serpenteava entre as pedras e refletia tons enérgicos de amarelo ouro, o céu estava azul e o momento foi de relaxante descontração. O lugar é chamado de As Jacuzzis, pois as piscinas, de tamanhos, formas e profundidades irregulares, lembram pequenas banheiras.

as Jacuzzis

as Jacuzzis

Jacuzzis (reprodução de foto da Internet)

Jacuzzis (reprodução de foto da Internet)

Após o almoço, subiríamos até o ponto mais alto do Monte Roraima, a cerca de 2800 m, na extremidade sul do planalto. Desnecessário dizer que quando eu consegui chegar ao topo, já era hora de descer. Não fiquei lá nem um minuto, enquanto os outros já estavam há, pelo menos, meia hora. De qualquer modo, o tempo tinha virado de novo e começou a chover forte. Desci e segui o grupo na última aventura do dia.

aos 2800 m no Monte Roraima

aos 2800 m no Monte Roraima

Como ainda era relativamente cedo, o guia sugeriu que fôssemos até umas cavernas, a cerca de uma hora de distância. Todos concordaram e lá seguimos nós, caminhando sempre sobre aquelas rochas negras, com cara de lua!

Ao chegarmos às cavernas, eu percebi que o acesso ao interior era muito difícil. Era necessário descer umas pedras, pular de uma rocha a outra, e o declive era extremamente acentuado. De fato, não era nada simples! Na verdade, elas estavam bem abaixo dos nossos pés! Eram rios subterrâneos, grutas e anfiteatros de pedras. Tínhamos que inclinar a cabeça no desfiladeiro para poder enxergar a entrada das cavernas. Como meu joelho esquerdo já tinha cumprido sua cota de esforço naquele dia, eu resolvi não arriscar e decidi retornar ao acampamento mais cedo. Michael me acompanhou e partimos. Sobre o monte, as trilhas não são visíveis, já que o chão é todo de pedras. Assim, uma das estratégias dos guias é sempre caminhar no mesmo lugar, de modo que se forma um desenho esbranquiçado naturalmente, pelas pegadas frequentes, e então, o caminho fica mais evidente. Eu fiquei chateada por não descer às caves e imaginei porque o guia não comentara previamente sobre a dificuldade de acesso na entrada das cavernas. Juro que teria me poupado aquela última caminhada.

Voltei ao acampamento umas quatro da tarde, me sentindo frustrada e literalmente enfezada! Sim, quatro dias de expedição e eu ainda não tinha feito “número dois”. O esquema do nosso banheiro era um pouco diferente sobre o Monte Roraima; como só há pedras lá em cima, não é possível deixar os presentes para Pachamama na terra e cobri-los de areia; devemos fazer tudo em sacolas plásticas que são devidamente levadas para baixo e destinadas ao lixo. Triste tarefa de retornar com esse peso… (Pra isso que também serviu pagar o pacote de “tudo incluído”). Enfim, como estava a ponto de explodir, me dirigi constrangidamente ao espaço escondido entre as pedras, onde foram deixadas sacolinhas plásticas e papel higiênico, e fiz o que tinha que fazer. Às vezes, eu me perguntava por que estava ali…

Apesar de termos caminhado cerca de oito horas nesse dia, não chegamos a ir ao Marco da Tríplice Fronteira, monumento situado exatamente sobre a fronteira dos três países que abrigam o Monte Roraima: Brasil, Guiana e Venezuela. Ele era muito longe, a cerca de três horas de caminhada do acampamento. Geralmente, as trilhas de oito dias é que chegam até esse ponto. As de seis costumam permanecer em território venezuelano, que abarca 85% do território do Tepui.

Nesse dia ainda, algo muito estranho tinha começado a acontecer no meu corpo. Ainda pela manhã, eu levei um susto ao olhar para minhas mãos e verificar como estavam inchadas. Horas depois, antes do almoço, eu senti meus olhos apertados e meus companheiros realmente afirmaram que eles estavam como duas bolas de golfe! Perguntei ao guia se ele tinha alguma ideia do que poderia estar acontecendo e “frio” foi sua resposta categórica. Segundo ele, o mesmo sintoma já tinha acometido outros visitantes do Monte Roraima. Eu não me convenci dessa explicação de jeito nenhum, afinal já tinha experimentado sensação térmica de 37 graus negativos em outras viagens e nunca tinha inchado feito um balão de festa! Novamente, entretanto, como nunca achamos que nada de ruim acontecerá conosco, dei de ombros e continuei na aventura.

Estava tão cansada que dormi sem jantar.

cara de balão

cara de balão

Quinto dia:

Na manhã do dia seguinte, meu rosto parecia uma bola de futebol e meus olhos estavam quase fechados. Temi não conseguir descer, pelo simples fato de não enxergar o caminho. Depois do café da manhã, um mingau reforçado, nos encaminhamos para a descida. Eram 6h30min.

Nós tínhamos subido até o topo do Monte Roraima em três dias, mas deveríamos descer e alcançar a comunidade indígena de Paraitepuy em apenas dois. Assim, nesse quinto dia de caminhada, a tarefa era chegar até o primeiro acampamento, do rio Ték, ou seja, abraçar dois dias em um: do topo até o “base camp”, que tínhamos feito no terceiro dia, e mais do “base camp” até o rio Ték, que fora o trekking do segundo dia. Será que pra baixo todo santo ajuda?

Consegui acompanhar o grupo desde o acampamento no topo até o início da trilha de descida. Antes de iniciar, paramos mais um pouco para nos maravilhar com o último contato com as montanhas; o céu estava límpido e a vista do Tepui Matauí, a montanha ao lado do Roraima, era de tirar o fôlego! Pedi para que as minhas fotografias me pegassem de costas. Só me faltava estragar as fotos com minha cara de balão!

vista do Tepui Matauí

vista do Tepui Matauí

Começamos a descer. O grupo me passou facilmente, mas Michael, meu fiel escudeiro, permaneceu ao meu lado. Nesse dia, aprendi que descer é mais difícil que subir, contradizendo a crença popular. Exige mais das pernas e dá mais medo. As pedras continuam lisas e soltas e a força da gravidade exacerba a possibilidade de quedas. Há que se escolher melhor aonde se pisa. Entretanto, Jean Pierre me ultrapassou e desapareceu tão rapidamente que parecia estar sobrevoando as pedras! Michael e eu nos intrigávamos em como eles desciam tão rapidamente sem soltar alguma pedra, escorregar e cair. Eu ainda estava sem a mochila, que fora levada pelo Simon. Lembrava-me de ter lido em um relato que contratar carregadores era explorar os indígenas e deveria ser motivo de vergonha. Pelo contrário! As famílias dos indígenas têm como oportunidade de trabalho o turismo de trekking no Monte Roraima. Eles vivem disso e é esse turismo que possibilita que a comunidade continue unida ali e não tenha que sair em busca de emprego nas cidades grandes. Simon ficou felicíssimo com o ganho extra que teria carregando nossas mochilas e até comentou que muitos turistas contratam os carregadores já no primeiro dia, a fim de aproveitar mais do passeio e desfrutar das paisagens sem peso; “Eles vão só tirando fotos” – disse entusiasmado.

pedras soltas no Caminho das Lágrimas

pedras soltas no Caminho das Lágrimas

trilha do topo ao base camp (reprodução de imagem da Internet)

trilha do topo ao base camp (reprodução de imagem da Internet)

pedras lisas e soltas

pedras lisas e soltas

O caminho de descida, cerca de 13 km, já que compreendia dois dias, deveria ser feito num tempo ideal de aproximadamente oito horas. Como tínhamos saído por volta das seis e meia da manhã, deveríamos chegar ao primeiro acampamento não mais que três da tarde. E assim foi para praticamente todos do grupo, que atingiram o objetivo, tomaram banho de rio, beberam cerveja morna, jogaram conversa fora e descansaram o resto da tarde. Enquanto eles faziam isso, eu enfrentava uma das maiores provações que já passei na vida. Só para vencer o paredão e a mata, até o acampamento da base do monte, eu levei oito horas (o mesmo da vinda, apesar de estar descendo); eu estava muito vagarosa, pois a cada passo dado, gemia de dor no joelho esquerdo, ele estava completamente estourado e latejava terrivelmente! A falta de experiência também não me dava confiança para descer correndo já que, pelo menos, meu pulmão não tinha que lutar contra a gravidade e estava do meu lado, trabalhando a meu favor. Meus olhos estavam inchados e eu me sentia esgotada fisicamente. O guia descia e voltava várias vezes para checar como eu estava ou para me dar maças e bolachas no caminho. Eu via o barracão de lona azul do “base camp” tão distante, que parecia nunca se aproximar. Finalmente, ao final das oito horas, umas 2h30min da tarde, atingimos o acampamento da base. O guia nos esperava com sanduíches e suco no galpão azulado. Exatamente nesse momento, uma chuva torrencial despencou sobre o parque, e meia hora depois parou e lavou o céu, como se nada tivesse acontecido; senti um acalento por ainda não ter que caminhar sob uma tempestade.

Começava a segunda etapa, o caminho de mais 9 km que tínhamos percorrido no segundo dia, rumo ao acampamento do rio Ték. Eu achei equivocadamente que, a partir dali, tudo ficaria mais fácil, já que a trilha seria de descida constante e não tão acentuada. Porém, como meu joelho estava realmente avariado, descer era uma tortura e as muitas pedras do chão faziam os pés entortarem e o machucarem ainda mais. Nesse ponto, o Michael se afastou de mim e o guia mantinha uma distância estratégica só pra ver se eu não desmaiava ou caía dura no chão. Eu estava sozinha, com meu bastão, pé ante pé, devagar quase parando e escutando só o som da minha respiração. Sabia que ainda faltava muito e quis chorar. O lugar era lindo e eu tentava, sinceramente, tirar o melhor da situação e apreciar a beleza.

Passei pelo guia que mansamente sentia a brisa nos cabelos, sentado em uma rocha. Ele estava só me esperando. Como uma criança em viagem, perguntei se ainda faltava muito realmente, ao que ele afirmou com um aceno de cabeça e uma expressão de pura pena. Continuei e lá ele ficou, admirando a Gran Sabana, como se a olhasse pela primeira vez; eu ia me afastando e olhando pra trás, e ele ficava cada vez menor até parecer uma formiguinha. De repente, vi que começou a andar. Eu pensei resignada que ele tinha dado todo o tempo do mundo pra que eu me adiantasse e, mesmo assim, era certo que me alcançaria em poucos minutos.

Mais adiante, me juntei novamente ao Michael, que estava me esperando. Temia que começasse a anoitecer e tentei apertar o passo. Mas, sem que eu pudesse evitar o avançar do tempo, o dia deu lugar à noite e sacamos de nossas lanternas para nos guiar. Nem tínhamos alcançado o rio Kukenán e eu imaginei como seria atravessar os dois rios no escuro! Algumas horas depois, tive a resposta. Nosso guia principal e alguns ajudantes já esperavam à margem; eu tirei penosamente as botas e me lancei ao desafio primeiro. Só a luz fraca da minha lanterna iluminava a travessia. A correnteza estava forte e eu tremia de medo, enquanto pisava sofregamente sobre as pedras, agarrando o braço do guia. Minha confiança era zero e tudo piorava com a escuridão; apenas um feixe de luz ziguezagueava sobre a água. Quando eu finalmente alcancei a outra margem, no que pareceu ser uma eternidade, não aguentei e desabei a chorar. Enquanto o Michael atravessava e eu soluçava copiosamente, um dos guias tentava me consolar, afirmando que tinha sim gente pior do que eu.

Creio que ele ficou com tanta pena de mim, que se ofereceu pra me carregar. Eu pensei que ele estivesse brincando, mas ele indicou mesmo que eu pulasse no seu cangote e o agarrasse pelo pescoço. Qual foi minha surpresa quando, no momento que eu tomei a posição, a criatura saiu comigo em disparada, subindo a íngreme margem do rio como se estivesse voando. Vamos analisar: ele estava de chinelos, comigo a tira colo, no escuro e depois de já ter caminhado toda a descida do Monte Roraima. Ainda assim, ele subiu aquela encosta aclivada tão rápido que eu não o faria nem sozinha e com metade do meu peso. Eu fiquei pasmada com a força daqueles guias! Soube que eles e também atletas profissionais se distraem algumas vezes por ano com o gracioso passatempo de “quem sobe mais rápido o Monte Roraima”. Eles fazem apostas e partem correndo da comunidade de Paraitepuy até o topo do tepui, fazendo o mesmo trajeto de subida que nós levamos três dias para cumprir em poucas horas… Inacreditável!

O pobre e gentil guia andou me carregando por mais alguns minutos e claro que levar 60 kg nas costas eventualmente pesa pra qualquer um. Eu comecei a me sentir melhor e continuei mais uns 40 minutos por mim mesma. Chegamos ao rio Ték e atravessá-lo foi infinitamente mais fácil, já que ele é menor e mais raso.

Ao final de incríveis 14 horas, e 6 horas de defasagem em relação ao restante do grupo, entrávamos timidamente no galpão de refeições, onde nossos companheiros riam e tomavam vinho barato. Eles nos recepcionaram com certa ironia esfuziante e eu tive a mesma sensação de quando, na adolescência, me aplaudiram quando, pela primeira vez, eu acertei um saque no jogo de vôlei da aula de Educação Física. Aquele estranho sentimento de paternalismo complacente. A japonesinha Shoko observou que meus olhos e meu rosto tinham desinchado. De fato, eu enxergava melhor, mas ainda me sentia tão esgotada física e emocionalmente que tive de forçar um pouco de macarrão com salsicha goela abaixo. Só queria dormir.

Ao entrar na barraca, sentei com dificuldade. Tudo estava úmido e fedorento. As botas do Michael exalavam um odor tétrico. Parecia que um urubu flatulento, depois de se alimentar de repolho, estava ali. A dica que eu posso dar agora é que para evitar que o sereno ou mesmo a chuva umedeça as botas, já que elas passam a noite fora da barraca (já era difícil dormir com as mochilas dentro), é embalá-las em sacos plásticos. O fedor das botas só foi vencido pelo inacreditável cheiro de chulé que eu tinha no corpo inteiro! Ao tirar a calça impermeável e a fleece que eu tinha em baixo, vi que as minhas pernas estavam todas molhadas; no mesmo instante e imagino que por força do mau hábito, reclamei com Michael sobre a parca qualidade do equipamento comprado no Brasil. “Olha só! Essas porcarias de calças pra chuva não servem pra nada! Tô toda encharcada!”. Segundos depois, percebi envergonhada que, na verdade, as calças funcionavam, e muito bem; elas não tinham deixado a chuva entrar, mas tinham sim impedido o suor de sair! As minhas pernas estavam brilhando de suor, que nojo! Suada, imunda, cansada, sem ver banho há quatro dias, tudo que eu queria era desmaiar logo, para que o final daquilo tudo chegasse mais rápido.

Sexto dia:

Temendo atrasar o grupo, já que tínhamos, nesse dia, horário a cumprir, eu me levantei uma hora mais cedo, comi umas bolachas e já me coloquei em marcha. Óbvio que não precisei esperar muito para que as primeiras pessoas, que levantaram mais tarde, tomaram café e provavelmente não se apressaram, passassem por mim.

Enfim, com dor e muita determinação, venci os mesmos 12 km do primeiro dia, com tempo adequado de cinco horas e meia, o mesmo da ida. As vans já nos aguardavam na comunidade de Paraitepuy e minha mochila também estava lá. Foi servido o almoço, os carros carregados e os guias devidamente presenteados de satisfatórias gorjetas (50 bolívares de cada um); as gorjetas e refrigerantes que são vendidos na comunidade são a única oportunidade de se usar dinheiro no Monte Roraima. Assim, não é necessário carregar uma grande quantia pra lá.

Subimos nas vans e demos adeus à mágica montanha. Eu senti que cumprira meu dever e estava satisfeita. Por mais difícil que tivesse sido, eu podia dizer que tinha subido o Monte Roraima e visto as mais incríveis paisagens, conversado com gente de vários países e até feito cocô no saco plástico! Experiências únicas e inesquecíveis! Vendo o monte se afastar, pela janela do carro, eu fui até capaz de jurar que estava melancólica…

Chegamos a Santa Elena de Uairén à tarde e, ao invés de irmos embora no mesmo dia, resolvemos descansar e sair da cidade na manhã seguinte. Pegamos, novamente, um quarto no hotel Michelle e duas horas foram pouco em baixo do chuveiro! Aquele banho foi melhor que um orgasmo múltiplo (se é que eu já tive um…)! Deixar a água quente escorrer pela cabeça, cheirar o perfume do sabonete, limpar as unhas ou escovar os dentes são atos tão simples que não chegamos a dar o devido valor no dia a dia, mas como essas pequenas sensações de conforto e civilidade me foram íntimas naquela tarde! Meu joelho ainda doía demais, tinha queimaduras no pescoço e nas orelhas e bolhas latejantes nos calcanhares, do tamanho do Monte Roraima. Eventualmente, tive que estourá-las com uma agulha para que pudesse conseguir caminhar normalmente. Foi bem dolorido!

De banho tomado e roupas limpas, atravessamos a rua e fomos até o escritório da Kamadac, onde também funcionava uma pizzaria, para jantar de graça, oferecimento da agência! O grupo, limpo e feliz encheu a pança de pizzas, que estavam muito boas, por sinal.

Naquela noite, ao passar as fotos da máquina pro meu laptop, eu fiquei simplesmente horrorizada de ver meu rosto no computador. Já no terceiro dia de trekking, na subida de 4 km, rumo ao topo, minha testa já começara a inchar. Eu não percebi nada, pois não me vi no espelho por dias; só soube que meus olhos e rosto incharam, pois tive dificuldades para enxergar. Jura o Michael que também não percebeu nada, mas eu não entendo como, já que eu poderia facilmente me juntar ao elenco de X-Men com aquela testa! Era um edema enorme que se estendia, em forma de triângulo de ponta cabeça, desde o meio dos olhos até o cabelo, por toda a testa! No dia seguinte, já no topo do Roraima, como relatei, o inchaço desceu para os olhos e restante do rosto, além das minhas mãos. Lembro-me do guia ter falado em frio, mas sem estar convicta daquilo, fui buscar informações na Internet e conversei com uma amiga, formada em enfermagem pela USP e professora universitária. No final das contas, pelos sintomas que eu apresentei, como inchaço na subida e melhora na descida, fadiga, falta de apetite, falta de ar nos esforços e edemas nas mãos e testa, nós descobrimos que eu sofri do chamado “Mal de Altitude”. Apesar de o Monte Roraima ter 2800 m, relativamente baixo em relação a tantas outras montanhas, eu vivo em uma cidade que está no nível do mar; assim, a combinação infeliz de esgotamento físico e altitude a qual eu não estava acostumada não me fizeram nada bem. Li que o mal de altitude, ou “doença das alturas” ou ainda “mal da montanha”, pode se manifestar a partir dos 2400 m para pessoas mais suscetíveis. Uma colega de trabalho da minha amiga, ao ver as fotos, afirmou veementemente que no terceiro dia, assim que o edema tivesse apontado, eu deveria ter sido obrigada a descer imediatamente, retornando ao primeiro acampamento, e que tive muita sorte de ter escolhido o trekking de seis dias, já que, segundo ela, se tivesse ficado um dia a mais no topo do monte, situações potencialmente fatais poderiam ter se instalado, como o desenvolvimento de um edema cerebral, pulmonar ou o fechamento da minha glote e consequente obstrução da respiração, sem que nada pudesse ser feito naquele fim de mundo!

Nesse sentido, apesar da Kamadac ter sido ótima e os guias, solícitos e amáveis, ninguém está verdadeiramente preparado para dar um suporte médico adequado no Monte Roraima. Ninguém é treinado, nem para enxergar o perigo ou, muito menos, para agir numa situação emergencial; não há sequer um posto de saúde em Paraitepuy e, conforme avisado pelo próprio dono da Kamadac, no dia da reunião na agência, antes do passeio, nós deveríamos estar cientes de que se caíssemos ou quebrássemos uma perna, por exemplo, o helicóptero, chamado por rádio, teria o custo de quatro mil dólares e demoraria! Enfim, mostrei as fotos pra minha mãe somente depois que estava a salvo e dormi me sentindo grata à vida, naquela noite.

apesar de tudo...sorria sempre!

apesar de tudo…sorria sempre!

Vale a pena! (reprodução de foto da Internet)

Vale a pena! (reprodução de foto da Internet)

Segue um resumão do trekking:

Acampamentos Distância aproximada Tempo ideal Descrição
1º dia Da comunidade indígena de Paraitepuy até o acampamento do rio Ték 12 km 3,5 horas Algum sobe e desce, mas a maior parte do caminho nivelado; trilha limpa
2º dia Do acampamento do rio Ték até o Base Camp 9 km 4 horas Subida constante, mas não muito acentuada; trilha bem delimitada, mas com muitas pedras soltas
3º dia Do Base Camp até o topo; passagem pelo Caminho das Lágrimas 4 km 4 horas Escalaminhada; muitas pedras e barro
4º dia Circulando no topo 8 horas Vale dos Cristais; Vale dos Pênis, Catedral, La Tortuga (formações rochosas); Abismo; La Ventana; As Jaccuzis; Marco da Tríplice Fronteira; ponto máximo aos 2800 metros de altitude
5º dia Do topo até o acampamento do rio Ték 13 km 8 horas Volta
6º dia Do acampamento do rio Ték até Paraitepuy 12 km 4 horas Volta

Dia 26 de maio, depois de uma noite bem dormida, levantamos tarde, arrumamos nossas mochilas, pegamos a roupa que tínhamos mandado lavar e fizemos check-out do hotel Michelle. Almoçamos e passamos a tarde na Internet. César Rollings, o gentil dono da Kamadac, nos oferecera uma carona até a rodoviária, à noite. Na verdade, não era nenhum sacrifício, já que o terminal de ônibus não ficava longe, mesmo assim, tinha sido um extra que ele não precisava fazer. Ainda, dentre as suas cortesias, ele também nos fizera o favor de comprar as passagens de Santa Elena até Ciudad Bolívar, ainda no estado venezuelano de Bolívar, e de nos ajudar a trocar mais dinheiro.

Na volta do Monte Roraima, estávamos sem muita moeda local, pois tínhamos trocado pouco quando chegamos a Santa Elena. Assim, Michael estimou que deveríamos cambiar uns 1000 dólares cada, para o restante da Venezuela. Nessa tarde, havia poucos cambistas na Esquina dos Quatro Cantos e os que estavam lá, conforme descrição do Michael, pareciam muito “mal encarados”, além de oferecerem uma cotação horrível de 8,2 bolívares para U$1,00. Como era muito dinheiro, ele foi pedir ajuda ao César. Mesmo saindo do banho, de toalha enrolada, ele se prontificou todo a levar o Michael de Gran Cherokee a um vulgo cidadão apelidado de “Panela”, colombiano e chefe dos cambistas locais. Nossa cotação, antes do trekking, tinha sido muito boa, 8,6 bolívares cada dólar; Panela, que foi encontrado na supra citada esquina, com ar de mafioso e guarda costas a tira colo, rapidamente ofereceu 8,9 depois de saber que eram dois mil dólares em notas de cem. Com sorriso de orelha a orelha, amabilidade sem fim e capanga na cola, Panela encaminhou César e Michael à sua própria casa e, enquanto a mulher assistia Raul Gil na sala de estar, foi ao quarto pegar a soma necessária, em grandes bolos de notas. Ao pegar os dólares do Michael, Panela comentou alegremente: “Hoje mesmo eu vou fazer muito dinheiro com isso!”. Na despedida, ele se surpreendeu com nossa nacionalidade, pois, segundo ele, os brasileiros só vinham com Reais. Ao mesmo tempo, Jaison, o australiano, não tinha dólares, mas reais pra trocar por bolívares e, frente a cotações nada vantajosas em Santa Elena, ele voltou até Pacaraima, na fronteira do Brasil e a 15 quilômetros de lá, só para trocar o dinheiro, afirmando que a diferença dava pra pagar o táxi e ainda sobrava.

Enfim, com dinheiro no bolso, pegamos o ônibus para Ciudad Bolívar, nosso próximo destino. Eu curiosamente já havia lido, inclusive num guia de viagens oficial, que os ônibus na Venezuela costumavam ser frios e o conselho era para viajarmos bem abrigados. Até aí, não tinha nada de novo, pois nas minhas frequentes idas e vindas entre Blumenau e São Paulo, mesmo durante o verão, sempre vou com casacos de pele nos ônibus da empresa Catarinense, já que os acho muito frios. Entretanto, não há nada, prestem atenção, nada que pudesse nos ter preparado para aquela insanidade!

O ônibus partiu às 7h30min da noite, com uma hora de atraso. Os alemães bons de garfo sentaram-se à nossa frente e levavam os seus sacos de dormir. Eu tinha dois casacos e a certeza de que eles seriam suficientes e de que o casalzinho estava exagerando. Em pouco tempo, descobri que se frio me fizesse inchar, como afirmara o guia do Monte Roraima, eu estouraria como uma bexiga cheia! Tive ganas de assassinar os alemães pelos seus sacos de dormir e sentia o vento gelado do ar condicionado entrando nos meus ossos. Se não bastasse o ambiente de frigorífico que vencia meu fleece e casaco corta vento, havia a corrente de ar congelante que soprava das aberturas do teto e do friso entre ele e as janelas e também ultrapassava qualquer proteção mais simples. Em posição fetal e cobrindo a cabeça com o capuz do casaco, eu ainda tremia feito vara verde e podia jurar que minhas pernas, pés e mãos estavam necrosando! Eu não tenho adjetivos pra descrever o frio dos ônibus venezuelanos a não ser “insano”! É enlouquecedor, desrespeitoso e não faz o menor sentido! Como estava em um país estrangeiro e longe da segurança do que nos é familiar, eu não tive coragem de reclamar ao motorista ou, ao menos, fazê-lo parar para que eu pudesse pegar mais blusas no bagageiro. De qualquer modo, soube depois que, frente a pessoas que já tinham se alterado, a resposta era sempre de que o ar condicionado automático não podia sofrer ajustes; ou era frio do Ártico ou desligado! Suportei o resto da noite com resignado sofrimento. Então, sério mesmo, aconselho cobertores, sacos de dormir, luvas, gorros e muita proteção. Exagerem, mesmo que esteja um calor de 40 graus lá fora!

Ainda no Monte Roraima, um dos guias de outro grupo tinha nos parado para conversar durante o trekking e nos indicado uma agência de turismo em Ciudad Bolívar, que fazia o passeio a Salto Ángel. Não demos muita bola, mas aceitamos que ele pegasse nossos nomes.

19 Comments

19 thoughts on “Boa Vista (Brasil) – Pacaraima (Brasil) – Santa Elena de Uairén (Trek ao Monte Roraima)

  1. Perfeito!
    Meu email é vini_ofreitas@yahoo.com.br

    Queria pegar algumas dicas com vc, pois estarei fazendo o trekking em julho.

  2. geovane

    Depois do Monte Roraima, terminou o tour? Não seguiu o tour pela Venezuela até a Colombia, não? Se prosseguiu poderia me enviar o seu roteiro.

    obrigado

    torresgc@bol.com.br

  3. Thais Moura

    Olá. Adorei sua postagem sobre o Monte Roraima.

    Será que posso pegar algumas dicas com você??

    Bjs

  4. mario jr

    Fantástico o seu relato! Bom humor é tudo de bom! Parabéns!

  5. Ana, que maravilha a descrição de sua viagem ao Monte Roraima!
    Adorei e fiquei com uma vontade imensa de lhe conhecer….quem sabe?
    De longe não tenho a minima condição física para uma façanha deste naipe, mas ler seu lindo relato foi quase como se estivesse ido la’ também.
    Parabéns e obrigado!
    Abraços
    Pierluigi

  6. Sensacional! Pena que vc sofreu um pouco, mas pelo visto foi compensador!

    • 😀 Obrigada! Realmente, eu sofri, mas inteiramente por minha falta de condicionamento físico. Como você disse, entretanto, valeu mesmo a pena!
      Abraços!!!

  7. Pingback: Como escalar a beleza misteriosa do Monte Roraima | O jornaleiro

  8. Alda

    Parabéns! Seu bom humor ao escrever torna qualquer viagem mais divertida!

  9. Laura Drumond

    Caramba! Que relato detalhado!

    Muuuuito bom! Parabéns!

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